As chances de desenvolver a doença são pequenas quando o procedimento é aplicado logo após a mordida
Apenas cinco pessoas sobreviveram à raiva humana em todo o mundo até hoje, o que aproxima a letalidade da doença de 100%. Este ano, os cinco casos registrados no Brasil, três em Minas e um no Distrito Federal, tiveram desfecho fatal. Nos últimos dez anos, mais de 40 brasileiros desenvolveram raiva humana após exposição ao vírus e apenas um deles sobreviveu, em 2017, em Manaus.
O país tinha registrado uma cura anteriormente, em 2008, quando um pernambucano foi o primeiro a receber o tratamento experimental desenvolvido nos EUA. Tratado em um hospital de Recife, capital de Pernambuco, após ter sido mordido por um morcego na cidade de Floresta, Marciano Menezes se locomove em cadeira de rodas, tem dificuldade de movimentação nos braços e alterações na fala.
O sobrevivente de Manaus, Mateus Santos, tem ainda mais limitações, pois respira por aparelhos. Mateus e dois irmãos foram mordidos por morcego, mas seus irmãos não resistiram.
Na Bahia, o último caso de raiva humana foi notificado em 2017, no município de Paramirim, enquanto a capital baiana não registra casos desde 2004. A infecção identificada no interior foi transmitida por morcego, já o paciente de Salvador foi mordido por um cachorro contaminado, reforçando a importância da vacinação antirrábica e do não abandono de cães e gatos.
Prevenção
Para evitar a infecção pelo vírus rábico, que pode ser transmitido pela mordida de qualquer mamífero contaminado, é preciso agir rapidamente após a ocorrência de um acidente. O infectologista Adriano Oliveira explica que é necessário buscar um serviço de saúde para receber a vacina antirrábica e orientação quanto aos próximos passos.
“Quanto mais cedo melhor, não adianta observar (o paciente) porque se o vírus atingir o sistema nervoso central não haverá mais vacina que o proteja. A ideia é atingir o vírus, com os anticorpos induzidos pela vacina antes que ele atinja as partes mais nobres do sistema nervoso central”, alerta o médico. Embora o procedimento pós-exposição não ofereça 100% de proteção, reduz bastante o risco de desenvolver a doença.
De acordo com esquema elaborado pelo Ministério da Saúde, o procedimento profilático completo vai depender do tipo de animal envolvido no acidente – classificados em silvestres, de produção ou cães e gatos - e da gravidade do ferimento.
O indivíduo pode receber até quatro doses da vacina em 15 dias, com intervalos pré-definidos, além de uma dose de soro antirrábico, que tem a função de prolongar o período de incubação do vírus, permitindo maior tempo para o desenvolvimento da imunidade estimulada pela vacina.
“Tem determinadas regiões do corpo que sendo atingidas têm rapidez maior para o vírus atingir o sistema nervoso central, principalmente nas extremidades, mãos e pés. Quando essas são as regiões atingidas é importantíssimo que a vacinação seja feita o mais rápido possível”, reforça Oliveira.
A letalidade quase absoluta da doença é resultante do caráter neurotrópico do vírus, do gênero Lyssavirus e da família Rabhdoviridae. “O vírus caminha pelas vias nervosas até o cérebro e destrói determinadas regiões do cérebro, levando a um quadro neurológico grave, no qual o indivíduo fica agressivo, daí o nome da doença. Ele fica intolerante a estímulos externos”, diz o infectologista.
A raiva humana também gera um quadro de hidrofobia, tendo sido conhecida por esse nome no passado. O paciente fica com aversão a beber água, em decorrência da dor sentida ao engolir a água, esclarece o médico. Desta forma, a pessoa que desenvolve a infecção geralmente fica desidratada.
Tratamento
O Hospital Oswaldo Cruz, em Recife, foi o primeiro no Brasil a aplicar de maneira bem sucedida o tratamento experimental da raiva humana. O conjunto de medidas adotado foi adaptado do Protocolo de Milwaukee, desenvolvido nos EUA pelo médico Rodney Willoughby Jr, em 2004, e mais tarde revisado e oficializado como protocolo recomendado pelo Ministério da Saúde (MS).
Apesar da baixa taxa de sucesso, o protocolo de Milwaukee e suas adaptações são os únicos que já resultaram em cura após a infecção aguda pelo vírus da raiva, com dois casos nos EUA, um na Colômbia e dois no Brasil.
De acordo com o protocolo do MS, além da sintomatologia e histórico do paciente - a exemplo de acidente com mamíferos sem realizar ou sem completar o procedimento pós-exposição, ou fazê-lo fora do tempo ideal -, o diagnóstico conta com alguns exames capazes de identificar a presença do vírus rábico no organismo.
O paciente deve ser isolado e mantido sob sedação, com ventilação mecânica, quando dá entrada no hospital com suspeita da doença, recebendo uma dieta hiperprotéica e hipercalórica. Uma vez que a raiva humana é confirmada, a pessoa é colocada sob sedação profunda e passa a receber um antiviral e uma substância chamada biopterina, um cofator na produção de alguns neurotransmissores.
Vacina é aprovada apenas para os cachorros e gatos
A raiva é uma doença 100% letal para os animais, por isso é fundamental manter atualizada a vacinação de cães e gatos, únicas espécies que contam com imunizante aprovado. No próximo dia 8, o Centro de Controle de Zoonozes (CCZ) da Secretaria Municipal de Saúde iniciará uma campanha, criando postos itinerantes nos bairros, postos volantes percorrendo ruas e montagem de drive-thru aos finais de semana.
A campanha será realizada até 17 de setembro, mas a vacinação dos cães e gatos pode ser feita em qualquer período do ano, ressalta a chefe do Setor de Vigilância da Raiva do CCZ, Danielle Dantas. A SMS disponibiliza a vacina em cerca de 100 unidades de saúde, de segunda a sexta, das 8h às 14h. A lista pode ser consultada no site da secretaria (www.saude.salvador.ba.gov.br) ou ligando no 156.
“Aquela pessoa que cuida de um quantitativo de animais um pouco elevado, acima de cinco, seis animais, a gente faz o agendamento domiciliar e faz a vacinação”, acrescenta Danielle. Para agendar, basta ligar para o telefone 3611-7331.
Esquema
A primeira dose da vacina antirrábica pode ser dada aos cães e gatos a partir dos três meses de vida, com reforço 30 dias depois. Para que a proteção seja mantida ao longo do tempo, uma nova dose deve ser aplicada anualmente. A chefe da vigilância lembra que o animal precisa estar saudável, em caso de doença é preciso aguardar a recuperação antes de vacinar.
“Quando você está levando seu gatinho ou seu cachorrinho para vacinar, não é só a saúde dele que você estará protegendo, mas também a sua saúde e a saúde de toda a sua família e comunidade”, argumenta Danielle. Quando um animal doméstico tem raiva, ele deve permanecer totalmente isolado até que morra, pois até mesmo o contato para fazer eutanásia não é totalmente seguro, explica a veterinária.
Em sua avaliação, há ainda muito desconhecimento sobre a gravidade da doença e suas formas de transmissão. “Tem muitas pessoas que não sabem qual é o risco de ter contato com animais silvestres, como morcego, raposa…”, exemplifica. O vírus causador da raiva pode infectar qualquer mamífero, então no caso dos demais animais, para os quais não há vacina aprovada, o recomendado é não domesticar e evitar contato.
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