A menos que o atual comandante Tomás Paiva, queira passar a mão pela cabeça do general Marco Antônio Freire Gomes – ao contrário do que tem dito para a mídia, e apenas para a mídia, num comportamento reativo, quando deveria se dirigir à Nação -, será difícil engolir as desculpas do último comandante do Exército do governo Jair Bolsonaro (PL), Marcos Freire Gomes. O “ex” quer nos fazer crer que agiu no estrito campo legal, e nega participação no planejamento que desembocou no dia 8 de janeiro. Temos, porém, mais que uma razão para crer que não foi bem assim.
As notícias nesta sexta-feira (16/01/2024), dão conta de que a cúpula do Exército acredita que o general Freire atuou como “legalista” no período em que esteve no comando do Exército brasileiro e rejeitou participar das tratativas para um eventual golpe de Estado, para manter o então mandatário no poder. De acordo com a coluna do jornalista Valdo Cruz, do G1, apesar de hipotecarem votos de confiança no colega de farda, “generais da ativa querem que o ex-comandante esclareça como foram as conversas relatadas por Mauro Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, sobre a “minuta do golpe”.
Ora, ora, ora... Para que se prenderem às conversas, quando as evidências saltam aos olhos (a menos que eles, os generais), estejam com a visão prejudicada. Melhor seria se aterem às atitudes, assim fariam melhor julgamento. Ou ficamos todos desmemoriados, de uma hora para a outra?
No dia seguinte ao 30 de outubro, quando o candidato Luiz Inácio Lula da Silva foi declarado – e reconhecido mundialmente -, como o vencedor do pleito, as principais rodovias do país foram bloqueadas por hordas de “parrudos”, e foi sobejamente demonstrado que havia entre eles muitos “boinas vermelhas” e “Kids pretos”. O general Freire Gomes tomou alguma atitude? Não.
Em seguida essa turma se multiplicou em “acampamentos” país à fora, na frente dos quartéis – unidades que deveriam obedecer às ordens do seu comando, e Marco Antônio Freire Gomes ignorou, tolerou e, o pior, defendeu a permanência desses desvairados no entorno das unidades militares, incluindo o seu QG, onde eram fartos os churrascos, não faltou luz (de onde vinha?), tampouco água, banheiros químicos, cozinha industrial e chuveiro quente. Afinal, não podia faltar conforto para os parentes e amigos do ministro José Múcio - foi ele quem disse que os tinha lá -, e do general Villas Boas, que havia ocupado o mesmo posto, no governo de Dilma Rousseff.
No dia 11 de novembro, como sabemos todos, o general assinou, acompanhando o almirante Almir Garnier (Marinha) e o brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior (Aeronáutica), na qual condenavam "eventuais excessos cometidos em manifestações" (quando o acampamento em si já era uma transgressão), e criticaram "eventuais restrições a direitos, por parte de agentes públicos". O direito de derrubar o governo recém-eleito? Como negar? Aqui, tal como no jogo-do-bicho, “vale o escrito”.
E, não satisfeitos, ainda registraram ser “condenáveis tanto eventuais restrições a direitos, por parte de agentes públicos, quanto eventuais excessos cometidos em manifestações que possam restringir os direitos individuais e coletivos ou colocar em risco a segurança pública; bem como quaisquer ações, de indivíduos ou de entidades, públicas ou privadas, que alimentem a desarmonia na sociedade", diziam na nota, os comandos das Forças Armadas. Desmintam, e o universo das redes sociais regurgitarão milhares de versões dessa nota, transcrita à exaustão pela mídia.
Não bastasse, nas conversas transcritas na delação do ajudante-de-ordem, Mauro Cid, o general Freire Gomes é citado como participante da reunião com os comandos, em que lhes foi apresentado o plano e a minuta do golpe, em que ele se diz protagonista de um ato heroico. Negou-se a aderir e ameaçou Bolsonaro de prisão. A versão apresentada por Cid é outra. O que ficou registrado foi que o general leu a minuta (atitude por si um crime), não denunciou e ainda – conforme consta da delação de Cid – sugeriu que ela ficasse “mais enxuta”, no que foi atendido.
Para se defender, Freire Gomes alega que se denunciasse às instituições, jogaria o país na convulsão social. Se bem entendi, ele evitava a “convulsão social”, porque nos legaria uma ditadura, sabe-se lá por quantos anos mais. É isso mesmo? Era melhor assim? Tanto zelo pela nossa paz chega a ser comovente.
E, admitamos que sejamos assim, benevolentes e ingênuos, e preferíssemos mesmo uma ditadura a um susto ao saber que estávamos na bica de sermos garfados em nossa decisão democráticas... Não poderia o general ter nos contrariado e se eternizado em uma estátua – eles adoram isso -, atravessando a praça rumo ao STF, ou mesmo ligando para um jornalista amigo, para dar esse furo? Eu adoraria se tivesse sido para mim...
Mas, cheio de dedos, o general Marcos Freire Gomes, não deu voz de prisão coisa nenhuma, não comunicou ao STF, não passou – ainda que em off, a cópia da minuta para um jornalista da sua confiança. Esperou quietinho ver para onde soprava os ventos da política do seu (ainda que secretamente), “mito”. Sem desabusar os recados de Biden, ou colocar em risco o acordo com o “Comando Sul”, dos EUA, ele preferiu investir numa roupagem ao avesso dos “melancias”, como o general Luna e o atual comandante (que quer muito acreditar no colega). Marco Freire Gomes preferiu dar a entender que era vermelhinho por fora, e verdinho por dentro. Se o vento assoprasse para a direita, ele poderia dizer que pensou melhor e só implicou com o “estilo” da minuta, mas até que o conteúdo era bom. E, se o caldo entornasse, ele viria com a versão “legalista”, que agora tenta nos “vender”, como se não tivéssemos acompanhado toda a sua “evolução”. Acontece que, além de perder no quesito harmonia, Freire Gomes desafinou o coro dos contentes e atravessou o samba de enredo do golpe. Nem dá para acreditarmos na sua fantasia de herói, tampouco no “legalista”. Melhor encarar os jurados.
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