O atual diretor da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, falou à Globo News nesta quinta-feira (4) e deu maiores detalhes de como funcionou o esquema clandestino de espionagem da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) de Bolsonaro que monitorou ilegalmente mais de 30 mil cidadãos brasileiros, especialmente jornalistas, professores, sindicalistas, políticos e juízes críticos ao ex-presidente inelegível.
De acordo com Rodrigues, os dados monitorados pelos arapongas da extrema direita ficavam armazenados em Israel, lar da Cognyte, empresa que vendeu o sistema FirsMile ao governo federal durante a gestão Michel Temer (MDB) para ser usado pelo general Walter Braga Netto na intervenção na segurança pública do Rio de Janeiro. O mesmo sistema de vigilância foi utilizado por Bolsonaro no escândalo de espionagem clandestina, em que os dados coletados no monitoramento ficavam armazenados de forma remota, em nuvem.
“A investigação tem apurado que de fato houve o monitoramento de muitas pessoas, estima-se em 30 mil pessoas monitoradas clandestinamente, ou seja, de maneira ilegal”, reiterou Rodrigues.
A seguir, o chefe da PF revela maiores detalhes do software israelense de espionagem utilizado, que poderia localizar os desafetos do governo a qualquer momento. Rodrigues também reafirma que, em regra, eram monitoradas pessoas com opiniões contrárias ao governo Bolsonaro.
“A ferramenta no seu uso regular permite o rastreio mediante a invasão dos aparelhos. Não é apenas monitoramento de antena. Ou seja, há monitoramento telefônico de sinais – não de dados ou mensagens – que apontam a localização exata que essas pessoas estão. E aí, a partir de cruzamento de informações, é possível supor quem esteve com quem e em determinadas circunstâncias. Isso traz uma série de consequências, principalmente porque não há justificativa técnica para o monitoramento dessas pessoas”, afirmou.
Operação Última Milha
No último dia 20 de outubro a PF prendeu dois ex-agentes da Abin de Bolsonaro por espionagem, fazendo uso indevido do sistema de geolocalização como meio de coerção indireta para evitar a demissão. Outros cinco agentes da Abin foram afastados de suas funções. Eles atuaram sob o comando do atual deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) durante o governo Bolsonaro.
"Os investigados podem responder, na medida de suas responsabilidades, pelos crimes de invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei", diz a PF em nota.
Segundo as investigações, o sistema de geolocalização utilizado pela Abin é um software intrusivo na infraestrutura crítica de telefonia brasileira. A rede de telefonia teria sido invadida reiteradas vezes, com a utilização do serviço adquirido com recursos públicos.
Alvos de prisão, os agentes Rodrigo Colli e Eduardo Arthur Yzycky teriam coagido colegas que tinham conhecimento do suposto esquema de arapongagem para evitar uma possível demissão. Outro alvo da operação seria Caio Cesar dos Santos Cruz, filho do general da reserva e ex-ministro de Bolsonaro Carlos Alberto Santos Cruz, que deixou o governo após atrito com Carlos Bolsonaro.
Caio Santos Cruz seria representante da empresa israelense Cognyte, que vendeu o sistema FirsMile ao governo federal durante a gestão Michel Temer (MDB) para ser usado pelo general Walter Braga Netto na intervenção na segurança do Rio de Janeiro.
Os atos fazem parte da Operação Última Milha, deflagrada pela PF, que cumpriu ainda 25 mandados de busca e apreensão nos estados de São Paulo, Santa Catarina, Paraná, Goiás e no Distrito Federal. As medidas foram expedidas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Dias depois, as apreensões também apontaram uma outra forma agir dos agentes ligados ao antigo ocupante do Palácio do Planalto que tentou se perpetuar no poder como um ditador.
Segundo o jornalista César Tralli, da GloboNews, os federais descobriram que os homens da Abin também invadiam em massa computadores de adversários políticos e de autoridades que não se alinharam a Bolsonaro. A infiltração nesses dispositivos seria feita usando uma espécie de vírus, que poderia ser instalado nas máquinas por meio de mensagens de e-mail fraudulentas, contatos via serviço de mensagens ou pen-drives.
O o spyware teria a capacidade de extrair qualquer dado dos computadores infectados pelos agentes da Abin, que a partir daí conseguiriam ver absolutamente tudo naquele dispositivo. A ação era de natureza ilegal e feita sem qualquer amparo na legislação vigente.
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