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Com aumento de casos do golpe do noivo gringo, governo brasileiro chegou a emitir um alerta

Cansada de relacionamentos com brasileiros que nunca cogitaram levá-la ao altar, Alice*, de 27 anos, decidiu se aventurar em aplicativos e conhecer um gringo, na esperança de realizar o sonho de usar véu e grinalda bem longe do Brasil.

Ela conheceu um homem de um país do Sudeste Asiático, palco de conflitos, violência e violações de direitos humanos. Por causa desse cenário, segundo a Agência de Refugiados da ONU (Acnur), 100 milhões de pessoas que moram nessa região foram forçadas a deixar suas casas no ano passado.

Alice não pesquisou sobre a realidade do país onde morava seu noivo gringo. Mergulhou em seu mundo de maravilhas e carência emocional. Estava apaixonada pelas promessas e declarações de amor feitas pelo homem que lhe pediu em casamento em poucos meses de conversa à distância e com uso do Google Tradutor.

Seu mundo começou a desabar pouco tempo depois de comprar uma passagem e ir ao encontro de seu “presente de Deus” em um país que atravessa uma grande crise humanitária. Após alguns meses, sem qualquer sinal de Alice, a família se desesperou. A irmã chegou a pedir ajuda nas redes sociais, afirmando que ela foi sequestrada. Hoje, Alice já está com a família, que prefere não comentar o ocorrido.

Alice não foi nossa única conterrânea que caiu em um golpe. A situação é tão preocupante que o Ministério das Relações Exteriores (MRE) emitiu um alerta sobre “numerosas queixas de cidadãs brasileiras vítimas de roubos, fraudes e violência cometidos por cônjuges estrangeiros que conheceram pela internet e com os quais tiveram pouco ou nenhum convívio presencial antes do casamento”.

Entre os relatos recebidos há denúncias de cárcere privado. Além disso, é frequente que os maridos estrangeiros mudem completamente de comportamento logo após a formalização do matrimônio, tornando-se agressivos e manipuladores ou interrompendo repentinamente o contato com as vítimas após obterem visto de permanência no Brasil.

Repatriação


Voltar para o Brasil não é nada fácil. Se engana quem pensa que basta uma ligação para o consulado e solicitar a repatriação. O processo é demorado e pode não acontecer. A assessoria do Itamaraty explicou que alguns requisitos precisam ser cumpridos para que a repatriação ocorra.

O novo Regulamento Consular Brasileiro, em vigor desde o dia 29 de dezembro de 2022, é taxativo: “não há previsão legal nem obrigatoriedade por parte do poder público, no Brasil, de pagar passagens ou custear deslocamento de cidadãos brasileiros”.

Segundo o Itamaraty, é preciso que sejam esgotadas todas as possibilidades para que a repatriação ocorra por meios próprios ou por intermédio de familiares, amigos ou empregadores, no exterior e no Brasil.

Essa condição será constatada após diligências junto a familiares e amigos, somente após essa fase, e após o recebimento da declaração de hipossuficiência [quando o indivíduo não tem condições de arcar com as despesas e custos], serão tomadas as medidas administrativas para a autorização dos recursos, se disponíveis.

Se o brasileiro ou brasileira já teve acesso ao processo de repatriação em outra oportunidade, a situação complica muito, pois de acordo com o novo regulamento, a concessão do benefício não é considerada.

Conflito de culturas

O pesadelo de brasileiras que caíram em enrascadas na busca pelo noivo gringo é amplamente abordado pela youtuber Danny Boggione. São diversos os depoimentos de mulheres entregues à própria sorte em um país que não entendem nem mesmo o idioma. A maioria das vítimas acreditou que encontraria seu pretendente em países do Oriente Médio, da Ásia e do Norte da África. Nessas regiões, a cultura está fortemente ligada à religião, principalmente, a muçulmana (também chamada de islâmica).

Diferentemente do Brasil, onde casamos hoje e se pode separar amanhã, o casamento é levado muito a sério na religião mulçumana. Embora os “noivos golpistas” usem e manchem a imagem do islamismo para atrair a atenção de brasileiras, sugerindo um ar de seriedade, o sheikh Ahmad, que recebeu a equipe jornalística no Centro Cultural Islâmico da Bahia, em Salvador, destacou como é o comportamento do homem muçulmano que tem interesse matrimonial em uma mulher.

“Casamento não é brincadeira no Islã. Por isso, o marido tem que querer saber quem é a família da moça. A moça também tem que conhecer ele e a família. Casamento é coisa séria. Única coisa que a gente enfatiza no casamento muçulmano é que homem é o chefe da família. Chefia não é superioridade. O chefe da família tem responsabilidade. Deve tratar sua mulher bem. Nosso Profeta Muhammad (Maomé) disse que melhor marido é aquele que trata bem a mulher dele, que sabe resolver as coisas de maneira pacífica. Mas quando um homem começa a agir negativamente, o problema dessa pessoa não tem nada a ver com Islã ou com pessoas muçulmanas. É caráter”, disse o líder do Centro Cultural Islâmico.

O líder islâmico também acrescentou que não é costume do homem muçulmano buscar relacionamentos por aplicativos, mas, se ocorre, ele reforça a importância da presença da família na relação do futuro casal, uma tradição preservada ao longo dos séculos. “Ambos têm que conhecer a família. Se você não conhece a pessoa, a gente não recomenda. O Islã quer que você leve um casamento sincero”, pontuou.

Embora o islamismo permita o casamento entre muçulmanos e mulheres cristãs ou judias, o sheik alerta para possíveis conflitos que o jugo desigual pode trazer grandes problemas. “A gente tem muitos irmãos que casaram antes de virar muçulmano. Islã disse que quando você vai casar com uma mulher e já descobre que não combina com a educação islâmica é problema. Se ela não está em nenhuma religião, não tem como fazer. A ligação entre duas pessoas tem que ser ligação de Deus. Precisa ter uma religião. Islã diz que não tem que forçar. Nunca vai dar certo, é bagunça”, afirmou.

Por que o visto brasileiro é tão desejado?


Segundo o advogado especialista em Direito Internacional, Tiago Borges, o passaporte é desejado pelo fato de o país ter poucos atritos internacionais, o que evita bloqueios com fechamento de circulação de brasileiros. Além disso, ele permite diversos benefícios a estrangeiros de países do Oriente Médio, alguns países da Ásia e a região do norte da África que se casam com brasileiras.

“Nesses países, o Brasil mantém uma relação amistosa, o que não acontece, por exemplo, com países como Estados Unidos e alguns da Europa, com alinhamento com Israel, o que gera atritos no chamado 'Mundo Árabe', que inclui o Norte da África, Irã e Iraque, por exemplo”, disse.

O especialista também explicou como é o casamento entre uma brasileira e um estrangeiro: “O casamento é regido pela lei do local onde ele é celebrado. Ele pode ser homologado no Brasil para ter validade aqui. Mas, normalmente, o casamento traz facilidades para aquisição da nacionalidade local”, alertou.

Ainda quero um noivo gringo, o que faço?

No alerta feito sobre o golpe do noivo gringo, o Ministério das Relações Exteriores sugeriu que as brasileiras obtenham referências do cidadão estrangeiro por parte de terceiras pessoas de conhecimento comum, além de evitar manter o contato restrito aos meios de comunicação à distância antes do matrimônio.

As brasileiras devem também buscar conhecer as práticas e leis do país sobre direitos das mulheres em casos de casamento e questões como guarda de menores em caso de eventuais disputas entre o casal. É importante deixar amigos e familiares avisados sobre planos de viagem e detalhes relevantes sobre a identidade do provável futuro esposo.

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