O Senado aprovou, nesta terça-feira (8), a indicação de Gabriel Galípolo, atual diretor de política monetária do Banco Central, para a presidência da instituição. Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o economista obteve 66 votos favoráveis e apenas cinco contrários.
Considerado um heterodoxo moderado, o mercado não vê em Galípolo alguém da bancada do PT, mas sim alguém bastante preparado para servir de ponte entre o mercado e o governo.
Em abril de 2022, antes da campanha de Lula ao Planalto começar oficialmente, o economista chamou atenção ao participar de um jantar com empresários na companhia de Gleisi Hoffmann, deputada federal e presidente do Partido dos Trabalhadores. O evento, organizado pelo grupo Esfera Brasil, reuniu nomes de peso do empresariado e mercado financeiro, como André Esteves (BTG Pactual) e Abílio Diniz (Grupo Península).
Na ocasião, Galípolo já era visto como possível nome capaz de promover uma integração entre o então candidato à presidência do PT e o mercado. Ao que tudo indica, a postura heterodoxa em relação à economia e passagem pelo mercado financeiro são vistas como um importante fator de ponderação na interlocução do atual governo com o empresariado. Não é à toa que a capacidade de diálogo e convencimento junto a atores diversos são características destacadas por quem o conhece.
O perfil “fora da caixa” do economista também chama atenção de ortodoxos de forma geral. Nesse sentido, defende conceitos econômicos desenvolvimentistas, como o apoio do Estado na industrialização e a crítica ao teto de gastos. Mas rejeita a oposição de políticas públicas ao setor privado, optando por concessões, parcerias público-privadas (PPPs) ou mesmo privatizações em determinados casos. Apesar de não ser filiado ao PT, tem relações com o partido há mais de dez anos, quando ajudou, em 2010, na construção do plano de governo de Aloizio Mercadante, atual presidente do BNDES.
Como braço direito de Haddad, Galípolo teve a dura missão de gerir um rombo inicial de cerca de R$ 300 bilhões nos cofres públicos e acomodar uma demanda crescente por políticas públicas e promessas de programas sociais feitas na campanha.
Poucos meses após ter assumido como secretário executivo do Ministério da Fazenda do terceiro mandato do governo Lula, Galípolo deixou o cargo para integrar a diretoria do Banco Central, por indicação do Ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A sua estreia no Copom “coincidiu” com a primeira queda da Selic desde que o ciclo de alta da taxa básica iniciou, em março de 2021.
Na autarquia, Galípolo superou o ceticismo de agentes do mercado quanto ao seu nível de autonomia em relação ao Palácio do Planalto, mas também protagonizou um dos momentos mais tensos na autarquia, na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de maio.
Na ocasião, a votação dividida pela redução da Selic em 0,25 ponto percentual (de 10,75% para 10,50%) gerou ruídos entre investidores, com integrantes indicados pelo governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL), votando pela posição vitoriosa, e nomeados por Lula defendendo um corte mais forte, de 0,50%. O episódio exigiu uma série de sinalizações posteriores de unidade dos integrantes da autoridade monetária para virar a página.
Nos últimos meses, Galípolo se tornou o principal favorito a assumir o BC a partir de 2025. O economista, inclusive, já atuava como “mensageiro” do Copom ao lado de Campos Neto, fazendo comentários sobre a política monetária do BC.
Quem é Gabriel Galípolo?
Gabriel Galípolo é formado em Ciências Econômicas e mestre em Economia Política pela PUC de São Paulo, instituição na qual também foi professor nos cursos de graduação, de 2006 a 2012. Além disso, lecionou no MBA de PPPs e Concessões da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo). É também pesquisador sênior do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
Sua passagem pela máquina pública teve início em 2007, no governo de José Serra (PSDB) em São Paulo. Naquele ano, o economista chefiou a Assessoria Econômica da Secretaria de Transportes Metropolitanos, e em 2008 foi diretor da Unidade de Estruturação de Projetos da Secretaria de Economia e Planejamento do estado de São Paulo.
De 2017 a 2021, Galípolo foi presidente do banco Fator, instituição com expertise em parcerias público-privadas e programas de privatização. Em sua atuação no banco, conduziu os estudos para a privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), processo que teve início em 2018. Em 2021, o banco Fator e o BNDES lideraram o leilão da estatal, operação que arrecadou R$ 22,6 bilhões com a venda de três dos quatro blocos ofertados.
Um heterodoxo moderado
No jargão econômico, as ideias heterodoxas (ou desenvolvimentistas) são aquelas que defendem a participação do Estado em setores estratégicos para o desenvolvimento do país. Ou seja, é o Estado ajudando a financiar infraestrutura, saneamento, tecnologia de ponta e outros segmentos cujos resultados demoram a aparecer e que seriam muito dispendiosos para o setor privado assumir sozinho.
Esse é o perfil que Galípolo construiu em sua vida acadêmica. Embora defenda claramente a atuação estatal como propulsora do desenvolvimento econômico, é conciliador e aberto ao diálogo. Ao lado do economista Luiz Gonzada Belluzzo, também heterodoxo e um dos fundadores da Facamp (Faculdade de Campinas), escreveu três livros: Manda quem pode, obedece quem tem prejuízo (2017); A escassez na abundância capitalista (2019) e Dinheiro: o poder da abstração real (2021).
Ainda antes de integrar o governo Lula, Galípolo havia se posicionado contra o teto de gastos. Em novembro de 2022, durante participação no Fórum Esfera Brasil, afirmou que o teto já havia passado da fase final do funeral e estava mais para “missa de sétimo dia”.
“Uma regra fiscal que funciona por excepcionalidades o tempo todo é uma regra que já não existe”, afirmou. Na ocasião, disse também que não via incompatibilidade entre o crescimento do Brasil e a sustentabilidade ambiental, nem entre a responsabilidade fiscal e o combate à desigualdade social.
No mesmo evento, Galípolo defendeu a necessidade de diálogo entre economistas e a sociedade sobre o orçamento. Na sua opinião, ao contrário do que muitos pensam, o problema do Brasil não é o tamanho do Estado, mas sim uma má qualidade da arrecadação e do gasto público.
“Quando olho para a média da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), não vejo o Brasil como um quasímodo, não tenho distorção. Mas quando olho para a estrutura de arrecadação, e para a estrutura de gastos do Brasil, aí sim eu tenho um monstro de gastos e concentrador de renda”, enfatizou o economista.
A relação com Haddad e a moeda única do Mercosul
Galípolo e Haddad compartilham pensamentos e posições muito semelhantes em relação à economia. No ano passado, escreveram juntos um artigo sobre como a criação de uma moeda do Mercosul poderia acelerar a integração regional.
A ideia não seria o fim da moeda de cada país, mas sim eleger uma que pudesse ser utilizada nas transações comerciais e financeiras entre os países da América do Sul.
O assunto não é novidade, pois o presidente Lula já havia abordado o tema em sua última passagem pela Presidência. E, logo após a publicação do artigo de Haddad e Galípolo, Lula voltou a defender a ideia.
“Vamos voltar a restabelecer nossa relação com a América Latina. E se Deus quiser vamos criar uma moeda na América Latina, porque não tem esse negócio de ficar dependendo do dólar”.
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