O vereador Clayton Sassá (União Brasil) - Divulgação
Em uma sessão da Câmara Municipal de Capão Bonito, interior de São Paulo, ocorrida na última semana, o vereador Clayton Sassá (União Brasil) protagonizou uma cena que rapidamente viralizou nas redes sociais: ao discutir a preservação de uma igreja histórica com mais de 150 anos, o parlamentar se posicionou "totalmente contrário ao tombamento, ao 'derrubamento' dessa igreja", evidenciando uma confusão conceitual básica entre tombamento (processo de preservação de patrimônio histórico) e demolição.
"Como que se destrói algo de 150 anos de história? Não é algo de 15 dias, é 150 anos de história naquela localidade", argumentou o vereador, defendendo, na prática, exatamente o que o tombamento propõe: a preservação do patrimônio histórico.
O episódio, que poderia ser apenas uma anedota isolada, revela um problema mais profundo e sistêmico na política brasileira: o despreparo de muitos representantes eleitos para exercer suas funções básicas. Quando parlamentares desconhecem conceitos fundamentais relacionados ao seu trabalho, as consequências vão muito além do constrangimento momentâneo ou da viralização nas redes sociais.
Erro conceitual, consequências práticas
O caso do vereador de Capão Bonito é emblemático porque o tombamento é um instrumento legal fundamental para a preservação do patrimônio histórico, cultural e arquitetônico brasileiro. Trata-se de um conceito básico para qualquer pessoa que ocupe um cargo legislativo municipal, já que decisões sobre patrimônio histórico frequentemente passam pelas câmaras municipais.
Após a repercussão do caso, o próprio vereador reconheceu o erro: "Logo em seguida, percebi o equívoco, pedi a palavra para me corrigir no momento, porém a palavra no momento da discussão do assunto foi passado a outro colega vereador", explicou à TV TEM. Posteriormente, decidiu "encarar com bom humor" a situação.
A capela Santa Cruz, objeto da discussão, é a mais antiga da cidade, construída em 1874 de forma artesanal, com paredes de um metro de espessura que preservam características originais feitas com terra batida e armadas em taipa de pilão. Um patrimônio que, ironicamente, o vereador queria proteger, mas usando os termos errados.
Problema generalizado
O despreparo parlamentar não é exclusividade de vereadores de pequenas cidades do interior, nem se restringe a um espectro político específico, apesar de um lado protagonizar mais cenas do que outro. Ao longo da história política brasileira, diversos parlamentares em diferentes esferas demonstraram desconhecimento sobre conceitos básicos relacionados às suas funções.
Entre os casos mais recentes, está o do deputado federal Alberto Neto (PL-AM) que criticou, sem nenhum embasamento, o programa Celular Seguro, do governo federal. A iniciativa, que prevê o envio de mensagens via WhatsApp ou SMS para notificar a ativação de celulares roubados em novas linhas, foi alvo de uma fala rasa e cheia de jargões do parlamentar. Logo em seguida, ele foi duramente refutado pelo deputado Henrique Vieira (PSOL-RJ).
Sem falar em um dos casos mais emblemáticos da história brasileira, quando deputados passaram diversas sessões debatendo o chamado “kit gay”, que simplesmente nunca existiu. Há vários outros exemplo, Brasil afora.
O custo do despreparo
Quando representantes eleitos desconhecem conceitos básicos relacionados às suas funções, as consequências são múltiplas e graves, desde debates empobrecidos sobre temas inexistentes que só servem para gerar pânico na população, até aprovação de leis ineficazes, contraditórias ou inconstitucionais.
Além disso, o nível das discussões nas casas legislativas cai drasticamente quando e o espaço que deveria ser um dos mais sérios do país, vira palco de piadas, representações teatralizadas com objetivo de ridicularizar grupos sociais e defesas de questões que atentam contra o melhor interesse da população.
Formação do parlamentar brasileiro
O Brasil não exige formação específica para candidatos a cargos eletivos, o que é coerente com o princípio democrático de amplo acesso à representação política. No entanto, isso não deveria significar a ausência de preparo mínimo para o exercício da função. A Câmara dos Deputados, por exemplo, possui o Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento (Cefor), que oferece programas de capacitação. No entanto, muitos parlamentares não demonstram interesse pela formação. Apenas pela 'lacração'.
Além disso, cada gabinete parlamentar conta com assessores que deveriam suprir eventuais lacunas de conhecimento técnico. Porém, em muitos casos, essas vagas são preenchidas por indicações políticas sem a devida qualificação técnica, perpetuando o ciclo de despreparo.
O papel do eleitor
O caso do vereador de Capão Bonito e outros exemplos históricos de despreparo parlamentar levantam uma questão fundamental: qual a responsabilidade do eleitor na qualificação do parlamento?
Em uma democracia representativa, o voto é o principal instrumento de controle da qualidade da representação. Ao escolher candidatos sem avaliar sua capacidade mínima e preparo para a função, o eleitorado contribui para a perpetuação de um ciclo de despreparo nas casas legislativas, no qual quem sai perdendo é sempre o povo. Fica a reflexão, porque 2026 é ano de eleger representantes.
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