Ministro Gilmar Mendes (Foto: Reprodução)
Em seu voto pela manutenção do acesso ao material da operação Spoofing por parte da defesa do ex-presidente Lula, Gilmar Mendes, apesar de observar que o conteúdo das mensagens hackeadas não estava em julgamento, fez questão de destacar vários absurdos e inconstitucionalidades reveladas pelos diálogos. Entre os mais chocantes, a cooperação ilegal da Receita Federal e da Polícia Federal com a Laja-Jato, capitaneada pelo então Juiz Sérgio Moro.
As duas instituições, em momentos distintos e repetidos, teriam fornecido informações sigilosas, sem a necessária autorização judicial. Os conteúdos obtidos ilegalmente vão desde conversas particulares gravadas por escutas telefônicas até declarações de Imposto de Renda de pessoas que nem sequer estavam sob investigação.
Polícia Federal
De acordo com o extraído dos diálogos, a Lava-Jato mantinha um grupo exclusivo com a membros da Polícia Federal no Telegram, através do qual eram discutidas estratégias, datas adequadas para conclusões de fases do processo investigativo e os desdobramentos de ações investigativas como noticiar a quebra de sigilo, por exemplo.
Além disso, o grupo também servia para troca de informações e debates sobre a vida particular de pessoas não investigadas ligadas direta ou indiretamente à Lula. Um dos casos que aparecem nos trechos citados por Mendes chegou a ser amplamente divulgado pela imprensa: o grampo ilegal de celulares de advogados da defesa. "As informações eram repassadas fora dos autos, em tempo real, pelo agente da Polícia Federal aos procuradores de Curitiba", salientou Gilmar Mendes.
"A orquestra acusatória liderada pelo magistrado [Sérgio Moro] era reforçada pela manutenção de um canal direto entre membros da força-tarefa e representantes da Polícia Federal. A fim de facilitar a troca de informações por meio de contatos, os procuradores estabeleceram um grupo de Telegram com os membros da Polícia Federal encarregados da condução da investigação contra o reclamante [Lula]", observou Mendes.
Em um dos trechos do diálogo lido pelo ministro, membros da Polícia Federal informavam que Lula, identificado nos diálogos como LILS (iniciais do seu nome) iria se encontrar com a então presidente Dilma Rousseff e questionavam se os procuradores queriam instalar escuta para mais alguém além deles.
"Pelos diálogos é possível depreender que o grupo "PF Lula" existia desde o início das investigações, em 2015 quando o chefe da força-tarefa [Deltan Dellagnol] chegou a advertir os colegas: 'Caros, cuidado com o que vamos falar no grupo da PF porque há dois que não conhecemos, viu? Antes tinha aquele maluco, imagina se ele estivesse no grupo? Não sei se estava, com a gente falando de Russo e tal", observou Mendes.
Russo era o apelido usado pelos procuradores da Lava-jato para se referir ao então juiz Sérgio Moro. "Vejam os senhores, é chocante é constrangedor", repetiu Gilmar Mendes diversas vezes, durante a leitura do seu voto que durou mais de .
Receita Federal
Em um modo semelhante de agir, a Receita Federal também teria participado da intrincada trama ilegal construída para incriminar Lula. "Fica evidente que os membros da força-tarefa de Curitiba solicitavam clandestinamente informações protegidas pelo sigilo fiscal à Receita Federal e só formalizavam o pedido na hipótese de identificação de algo que pudesse interessar ao órgão acusador", destacou, mais uma vez, Gilmar Mendes, comparando a Receita Federal à Stasi, polícia secreta totalitária da Alemanha Oriental, extinta em 1990.
De acordo com o exposto pelo ministro, a Lava-Jato recorreu diversas vezes a consultas ou informações, via Receita Federal, a alvos direcionados, entre eles a então esposa de Lula, Marida Letícia, e seguranças do ex-presidente. "O nível de especificidade e direcionamento dessas consultas, típico de uma verdadeira indústria colossal de espionagem, permitia que os procuradores tivessem acesso individualizado a notas fiscais, declarações de imposto de renda e outros documentos fiscais relevantes dos investigados. Tudo sem necessária autorização judicial prévia e em tempo real, via Telegram", palavras de Gilmar Mendes.
O contato da Lava-Jato dentro da Receita Federal era ninguém menos que Roberto Leonel, então chefe do Escritório de Pesquisa e Investigação da Receita em Curitiba. Como aparente prêmio pela colaboração, Leonel assumiu o cargo de presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) por indicação do então Ministro da Justiça, Sérgio Moro.
"Essa análise não exaustiva e ainda muito preliminar dos diálogos sugere a ocorrência de graves vícios em investigações e ações penais que podem ter afetado, ainda que potencialmente, o exercício de defesa do paciente [Lula] como pode ter evitado o direito de defesa de outros pacientes", finalizou Gilmar Mendes.
Veja aqui a sessão completa - Vídeo
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