Ciro Gomes (PDT) é entrevistado no Jornal Nacional (Foto: Divulgação)
O Jornal Nacional vai entrevistar, ao longo da semana, os principais candidatos à Presidência da República mais bem colocados na última pesquisa Datafolha de intenção de votos. Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT, aparece em primeiro lugar na pesquisa, mas o ex-presidente não pode dar entrevistas por determinação da Justiça.
Ele está preso em Curitiba, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Assim, desta segunda-feira (27) até a próxima quinta-feira (30) serão entrevistados, pela ordem determinada em sorteio, com a presença dos assessores dos partidos, Ciro Gomes, do PDT, Jair Bolsonaro, do PSL, Geraldo Alckmin, do PSDB, e Marina Silva, da Rede.
O Jornal Nacional vai abordar os temas que marcam cada uma das candidaturas, questionar assuntos polêmicos e tratar da viabilidade de alguns pontos dos programas de governo. Na semana de 17 a 21 de setembro, os candidatos mais bem pontuados pela pesquisa Ibope ou Datafolha, mais recente, também vão estar no Jornal da Globo.
O tempo total dessa entrevista é de 25 minutos. E, ao fim, o candidato vai ter mais um minuto para dizer que Brasil ele quer para o futuro. E o tempo começa a ser contado a partir de agora.
Renata Vasconcellos: Olá. Boa noite novamente, candidato.
Ciro Gomes: Boa noite.
Renata Vasconcellos: O tema de agora é combate à corrupção, Lava Jato. O senhor disse, em entrevistas recentes, que dá apoio total à Operação Lava Jato, que vem combatendo a corrupção no Brasil nos últimos quatro anos. Mas disse também que a Lava Jato é desequilibrada e que cometeu abusos, e que receberia a turma do juiz Sérgio Moro à bala, caso ele mandasse prender e se o senhor se considerasse inocente... À bala. Como convencer o eleitor de que o senhor realmente apoia a Lava Jato, com uma declaração dessas?
Ciro Gomes: Me permita, antes de responder, cumprimentar as Organizações Globo por essa oportunidade, dar boa noite a você Renata, boa noite ao Bonner, boa noite a todos os brasileiros, especialmente aqueles que, não me conhecendo, eu peço uma oportunidade hoje para me apresentar. As coisas são muitas vezes ditas num ambiente, num contexto, e essas coisas são tiradas do contexto. Eu apoio a Lava Jato, porque ela é uma virada de página na crônica de impunidade que sempre foi o prêmio para a corrupção dos grandões no Brasil. Como eu tenho a ficha limpa, tenho 38 anos de vida pública e nunca foi envolvido em qualquer tipo de escândalo, eu tenho, portanto, levo vantagem na disputa se o filtro da população for votar em gente séria. Entretanto, a Lava Jato só prestará bom serviço ao Brasil se ela for vista pela maioria ou pelo conjunto da sociedade como uma coisa equilibrada. E o lado do PSDB não tem nem um na cadeia. Claro que ela é muito importante, tá gente do PMDB, tá gente do PT na cadeia, mas não há um único quadro, apesar de mil demonstrações de corrupção do PSDB, nenhum deles foi preso, por exemplo.
Renata Vasconcellos: Mas, recentemente, o senhor disse também que, se eleito, vai colocar o Ministério Público e a Justiça de volta na caixinha. O senhor disse isso. As pesquisas de opinião mostram que os brasileiros apoiam os promotores, os brasileiros apoiam a Justiça. Não é mais uma declaração sua que vai justamente na contramão dessa sua afirmação, de que apoia a Lava Jato?
Ciro Gomes: Não, eu ajudei a desenhar essas atribuições do novo Ministério Público, porque fui constituinte no estado do Ceará e participei do debate nacional. A questão é que, nesse momento, há muitos abusos, Renata. Você não tem ideia do que tem sofrido os prefeitos municipais, você não tem ideia da destruição de reputações que se fazem depois, sem nenhuma consequência. Na medida em que o Ministério Público, isso é uma exceção, que o Ministério Público extrapola das suas atribuições, ele perde a grande nobreza da sua tarefa, que é vigiar o interesse público. Vamos...
Renata Vasconcellos: Mas o que é pôr na caixinha?
Ciro Gomes: É cada um ter a sua tarefa. Quando você está falando para o povo, você fala com uma palavra simples.
Renata Vasconcellos: Mas o presidente da República tem esse poder para pôr na caixinha de que forma?
Ciro Gomes: Tem esse poder. Ele tem o poder e interação com o Poder Legislativo de desenhar uma modernização institucional, que devolva cada um para fazer sua tarefa. Vamos tomar um exemplo, com o testemunho do povo brasileiro. Há três ou quatro domingos atrás, um juiz de plantão de um Tribunal Regional mandou soltar o Lula, meia hora depois o outro juiz, em cima da mesma lei, mandou prender de novo, desacatou pelo telefone. Depois, quatro horas depois, o outro mandou prender de novo, depois o outro mandou soltar de novo.
William Bonner: Mas, sim, candidato...
Ciro Gomes: Eu tô dizendo que parece o cachorro do Tom Cavalcante... Para dentro, para fora, para fora, para dentro, e o cachorro morreu esquizofrênico.
William Bonner: Mas, quando o senhor diz que vai botar na caixinha, que vai chamar o Legislativo, o senhor... Pressupomos que o senhor estará ocupando a Presidência da República, chefe do Executivo. Vai chamar o Legislativo para mudar lei, são três poderes, são três poderes independentes e harmônicos. Alguma coisa não fecha nessa equação. Porque, se são três poderes, como é que só o senhor, como presidente da República, e o Legislativo vão interferir nessa questão?
Ciro Gomes: Eu sou professor de Direito Constitucional. Não sou, não faço da vida pública meio de vida. Nunca quis fazê-lo. Veja, a teoria dos três poderes foi montada lá atrás por Montesquieu, em um livro chamado “Espírito das leis”. E basicamente hoje, modernamente, você tem um quarto poder que é o Ministério Público. Então, você tem dois poderes que são eleitos pela população. Então, ciclicamente a população renova o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Na suposição, evidentemente que tem crises como esta que nós estamos vivendo, em que há uma brutal traição da população, e você tem os poderes mergulhados na corrupção e na desconfiança e na descrença do povo. E os outros dois poderes são técnicos. Ninguém é eleito para ser juiz e ninguém é eleito para ser membro do Ministério Público. O que é que eles estão fazendo? Eles estão exercendo a política, na medida em que os dois poderes políticos estão desmoralizados. O que eu só quero fazer voltar o Brasil a poder ter paz, segurança jurídica. Porque se a lei é a mesma, não é possível um juiz mandar prender e outro mandar soltar no mesmo dia, quatro vezes, dois para cá e dois para lá.
William Bonner: Isso a despeito do manifesto apoio da população brasileira, ao Ministério Público e também ao Judiciário. Mas eu gostaria de insistir ainda na questão sobre corrupção, que é um tema importantíssimo ainda hoje. O senhor, num dado momento, o senhor disse que bota a mão no fogo pelo presidente do seu partido, Carlos Lupi. O senhor disse que acusações contra ele são malévolas, o senhor disse mais, que uma vez eleito presidente da República, Carlos Lupi ocuparia o cargo que ele quisesse no seu governo. Eu vou pedir licença nesse momento, porque eu preciso atualizar o público sobre o histórico de Carlos Lupi, e aí eu vou encaminhar a pergunta. Carlos Lupi responde a inquérito, no Supremo Tribunal Federal, numa investigação sobre a possível compra de apoio político para Dilma Rousseff, em 2014. Carlos Lupi foi denunciado pelo delator Carlos Miranda, que o acusou de receber R$ 100 mil de mesadas do esquema de corrupção do ex-governador do Rio Sérgio Cabral, do MDB. Carlos Lupi é réu por improbidade administrativa no Distrito Federal, e a Comissão de Ética da Presidência, quando Lupi ocupava um cargo no governo de Dilma, a Comissão de Ética recomendou a demissão dele, coisa que acabou acontecendo dias depois. A minha pergunta é a seguinte: qual é a coerência de se dizer intransigente com a corrupção e, ao mesmo tempo, o senhor escolher para integrar o seu governo uma pessoa com um perfil, um histórico como esse de Carlos Lupi, para que ele ocupe o cargo que ele quiser, candidato?
Ciro Gomes: Desculpa, eu não escolhi ninguém para ser ministro. Eu sequer fui eleito.
William Bonner: Mas o senhor disse que ele ocuparia o cargo que ele quiser.
Ciro Gomes: Eu vou repetir isso, eu vou repetir, só que não é correto eu dizer que eu escolhi ninguém para ser ministro, porque eu tenho a humildade, tô esperando o povo brasileiro...
William Bonner: Estamos falando em termos hipotéticos, o senhor também ainda não foi eleito.
Ciro Gomes: E eu estou falando em termos assertivos. Se eu for eleito, o Carlos Lupi terá no meu governo a posição que quiser, porque eu tenho convicção que ele é um homem de bem.
William Bonner: Mesmo com essa ficha?
Ciro Gomes: A mim me surpreende, na minha opinião essas informações não estão assentadas, porque a informação que eu tenho é que ele não responde por nenhum procedimento.
William Bonner: Ele é réu. Estão todas checadas.
Ciro Gomes: Réu ele não é.
William Bonner: Ele é réu.
Ciro Gomes: Réu com certeza ele não é. Então, eu estou surpreendido nesse momento.
William Bonner: Eu posso, ao fim dessa entrevista, até depois, para não tomar o tempo da sua entrevista. Ele é réu no Distrito Federal.
Ciro Gomes: Perfeitamente, e eu me comprometo, eu me comprometo também a adicionar qualquer esclarecimento necessário no meu site: cirogomes.com.br
William Bonner: Diante dessa informação: ele é réu, eu estou dizendo para o senhor. O senhor mantém a sua posição de oferecer a Carlos Lupi, no seu governo, o cargo que ele quiser.
Ciro Gomes: Eu não ofereci nada a ninguém. Eu espero muito humildemente ter o direito de servir ao Brasil como o seu presidente. Mas o Carlos Lupi tem a minha confiança cega.
Renata Vasconcellos: Cega?
Ciro Gomes: Cega. Absolutamente cega.
William Bonner: O senhor chama o presidente Michel Temer, já chamou o presidente Michel Temer, de quadrilheiro. E o senhor também já disse que o presidente Michel Temer tem, no ministério dele, corruptos, embora eles não tenham sido julgados ainda. O fato é que, na cabeça de um eleitor, como é que o senhor explica a defesa que o senhor faz de uma coisa para quem é um aliado seu, como o Carlos Lupi, e outra coisa para quem é um desafeto seu, como o presidente Michel Temer.
Ciro Gomes: Não, os valores que eu defendo são os mesmos. Deixa eu só lhe dizer uma coisa. O presidente Michel Temer, isso é uma desgraça para o nosso país, foi acusado pela Procuradoria-Geral da República e o Supremo pediu autorização duas vezes para processá-lo. O presidente Michel Temer é uma pessoa acusada formalmente pela Procuradoria-Geral da República por corrupção. Não é o caso, definitivamente, do Lupi até o segundo em que lhe falo, definitivamente. O senhor Michel Temer tem ao seu redor Eduardo Cunha, que já está preso, Geddel, que já está preso, Padilha, que não está preso ainda, mas está ali usufruindo do foro privilegiado, Moreira Franco, que está usufruindo do foro privilegiado – todos notórios corruptos da vida brasileira.
Renata Vasconcellos: Ainda falando sobre corrupção, o senhor disse recentemente que alertou o então presidente Lula sobre corrupção na Petrobras. Isso antes de a Lava Jato começar. Sobre o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, o senhor disse que sabia quem ele era. Sabia que ele estava roubando, e que disse isso ao ex-presidente Lula, ao então presidente Lula, que mesmo assim o manteve no cargo. Mesmo dizendo isso, ou seja, Lula terminou o segundo mandato em 2010, Sérgio Machado ainda continuou no governo por mais quatro anos. Por que o senhor não fez uma denúncia tão grave como esta ao Ministério Público?
Ciro Gomes: Porque quem faz denúncia ao Ministério Público assume o ônus da prova. E eu, evidentemente, não tenho o ônus da prova, porque não tenho acesso aos instrumentos de investigação.
Renata Vasconcellos: Mas, em outras palavras, o senhor disse então que o ex-presidente Lula não fez nada mesmo alertado pelo senhor.
Ciro Gomes: Neste e em muitos outros momentos.
Renata Vasconcellos: Pois é, o senhor disse...
William Bonner: Me permita só... Porque o senhor, quando mencionou publicamente esse alerta que o senhor teria feito ao ex-presidente Lula...
Ciro Gomes: Escrevi artigos na Carta Capital. Isso é uma coisa notória.
William Bonner: Mas então o senhor está dizendo aqui que o senhor não tinha provas das acusações que o senhor estava fazendo. É uma acusação grave, não, candidato?
Ciro Gomes: Sim, é uma acusação grave.
William Bonner: Ao maior, ao presidente da República.
Renata Vasconcellos: A maior autoridade pública...
Ciro Gomes: Vocês imaginam mesmo que um ministro, tomando notícia de uma coisa, tendo mais ou menos evidências, sem as definitivas provas, é ele que cabe representar o Ministério Público? Ou ele deve reportar ao seu chefe?
William Bonner: O senhor acha que, no caso, deveria reportar ao seu chefe.
Ciro Gomes: Isso é no mundo inteiro assim. Por quê? Porque senão você assume o ônus da prova, e o ônus da prova você não tem o instrumental investigativo do Ministério Público nem da polícia para fazer.
Renata Vasconcellos: Então, como eu ia dizendo, em outras palavras, o senhor disse que o ex-presidente Lula não fez nada mesmo alertado pelo senhor da corrupção, neste caso. Mas até pouco tempo o senhor elogiava o PT e o ex-presidente Lula e só passou a fazer críticas ácidas ao ex-presidente e ao partido dele depois que a sua tentativa de aliança falhou. Como esse seu comportamento combinaria justamente com o seu discurso anticorrupção?
Ciro Gomes: Eu não tenho que explicar a contradição da nossa brava imprensa. Eu nunca imaginei, nem ninguém colherá nenhuma declaração minha, que o PT deixasse de ter candidato próprio para me apoiar. Portanto, essa história de que eu esperava o apoio do PT jamais teve fundamento na minha vida.
Renata Vasconcellos: Não pretendia unir as esquerdas?
Ciro Gomes: Não, eu gostaria muito de fazê-lo, mas acredito que será no segundo turno. Deixa eu só explicar, entretanto. Para mim, o Lula não é um satanás como certos setores da imprensa e da opinião brasileira pensam. E também não é um deus, um anjo, como certos setores metidos a religiosos do PT pensam. Eu conheço o Lula há 30 anos. Ele foi um presidente que eu tive a honra de servir como ministro e foi um presidente que fez muita coisa boa para muita gente no Brasil. E, em respeito a essas pessoas, eu tenho, sempre que perguntado, como estou fazendo hoje, desejando falar das minhas propostas, eu faço essa menção a ele. O Lula foi um bom presidente pro Brasil e o povo brasileiro sabe disso. Todo mundo que está nos testemunhando, por mais raiva que tenha dele, sabe que cinco, seis, sete anos atrás, o Brasil estava com um poder de compra maior, o Brasil estava com condição de crédito muito maior, o Brasil estava com uma taxa de desemprego muito menor, e a população mais pobre, que é por quem eu trabalho mais devotadamente, sentiu na pele as consequências de um bom governo. Da Dilma para cá, tudo isso foi perdido. Mas isso não quer dizer que a gente deva rasgar a história nem comemorar o fato de ter o maior líder popular do país preso. Na minha opinião, pelo menos.
William Bonner: Candidato, vamos então agora a um outro ponto, que é o do seu programa de governo que também é importantíssimo, que é a questão do endividamento. Sem dúvida nenhuma, é uma questão gravíssima, é uma questão que aflige milhões de brasileiros, são mais de 60 milhões de famílias com esse problema. Só que, diante da gravidade do problema, o senhor veio a público e disse a seguinte frase: “Fique tranquilo, vou tirar o seu nome do SPC”. É uma frase muito simples. E tão simples que ela não traduz a complexidade daquilo que efetivamente o senhor está pretendendo fazer com os endividados brasileiros. O senhor quer fazer um refinanciamento dessas dívidas. No projeto Brasil Que Eu Quero, que eu imagino que o senhor já tenha visto, está no ar já há alguns meses no jornalismo da Globo, é muito frequente a presença de cidadãos brasileiros dizendo o seguinte: “Vote consciente, o Brasil que eu quero é o Brasil que o cidadão, eleitor, não troca o voto dele por uma promessa de favor de candidato nenhum". Neste ponto, eu pergunto ao senhor: diante da simplicidade com que o senhor ofereceu aos brasileiros essa promessa “vou tirar o seu nome do SPC”, embora se trate de um refinanciamento de dívida, o que que o senhor diz pra esse eleitor, que enxerga nessa sua forma de encaminhar a proposta, uma tentativa de oferecer a ele uma troca de favores?
Ciro Gomes: Isso não tem nenhuma coerência com a minha prática. Eu não estou propondo isso porque sou bonzinho, e quem transformou isso num hit da campanha não fui eu. Foram meus adversários, que qualquer coisa que vem pra pobre e pra classe média ficam logo pirados. Se você não me levar a mal, eu trouxe aqui em primeira mão, não vou lhe passar, você pegue depois para os repórteres, isso aqui é um manualzinho. Como fazer, quanto custa, por onde vem o dinheiro. Aqui tem como fazer.
William Bonner: Tem que ter um manualzinho...
Ciro Gomes: Aqui tem como fazer...
William Bonner: Esse é o ponto candidato. É onde queria chegar. É que eu não estou discutindo, veja bem, eu tenho que deixar isto bem claro. Eu não estou discutindo aqui a pertinência ou não de se fazer um refinanciamento de dívidas. Não se trata disso. O que eu estou questionando o senhor é sobre a simplicidade da formulação que o senhor fez de dizer "vou tirar o seu nome do SPC". Por quê? Porque diante da complexidade da operação, o senhor vai depender de bancos públicos, vai depender de bancos privados, vai depender mesmo da capacidade de pagamento de quem está endividado. Será que ele vai ter a condição de pagar? Quando se soma tudo isso e se junta numa frase dizendo "vou tirar seu nome do SPC", aquele cidadão endividado, eleitor, título de eleitor na mão, que ouve um candidato à presidência dizer algo desta simplicidade, poderá ser levado a acreditar que aquele candidato vai eliminar a dívida dele.
Ciro Gomes: Não...
William Bonner: Mas não é isso que o candidato vai fazer. É aí que eu lhe pergunto, se o senhor fica tranquilo de permitir que cidadãos eleitores possam ter essa interpretação para esse slogan fácil que traduz...
Ciro Gomes: Bonner, eu fui o governador mais popular do Brasil. O prefeito de capital mais popular do Brasil. O ministro da Fazenda entrava nos restaurantes do Rio de Janeiro debaixo de palma. Não é porque eu fiz milagre, não, é porque eu honro a minha palavra. E as coisas são simples. A palavra que eu digo não é essa, e eu vou repetir aqui: eu vou ajudar a tirar o seu nome do SPC. Por quê? Porque eu estudei o assunto faz um ano, com especialistas. A dívida média de quatro mil pessoas... R$ 4 mil, com desconto que no leilão do Serasa já tá acontecendo, essa dívida cai pra R$ 1,2 mil. Se eu faço um refinanciamento tirando os juros de 500% que eles hoje são humilhados, para 10%, 12%, o banco ganha dinheiro e eu refinancio isso em 36 vezes. A prestação cai de R$ 40 por mês. Eu vou tirar o nome do povo brasileiro do SPC mesmo.
William Bonner: O senhor disse agora há pouco que vai ajudar a tirar...
Ciro Gomes: É, mas é claro que eu não vou, se a pessoa não quiser, eu não posso fazer, mas aqueles que quiserem podem contar, eu vou ajudar a tirar o nome do SPC de todo mundo. Sabe por quê? Não é porque eu sou bonzinho, não, é porque eu tenho um projeto nacional de desenvolvimento que propõe respostas práticas de como reativar a encomia e gerar emprego. O primeiro grande motor na tradição brasileira, e não é o melhor, mas o primeiro grande motor de ativação da economia, um minuto só, é o consumo das famílias.
William Bonner: É só porque eu gostaria de deixar claro...
Ciro Gomes: Se você tem 63 milhões de pessoas humilhadas, com o nome sujo no SPC, como é que eu vou ativar o motor principal da atividade econômica...
William Bonner: Tudo bem, o que eu estou dizendo ao senhor era só essa questão, a forma como o senhor falou. Mas o fato mesmo de haver um livreto já com as instruções, já mostra que é...
Ciro Gomes: Posso passar? Em primeira mão. Agradecido pela oportunidade extraordinária que estão me dando de explicar.
William Bonner: É bem mais complexo do que a frase simples indicava...
Ciro Gomes: Está tudo aí, inclusive as garantias. Aval solidário, que a gente já tem muita experiência.
Renata Vasconcellos: Então, como a gente viu, de fato é bem mais complexo do que um simples slogan, tanto é que precisa de um livreto.
Ciro Gomes: É muito simples. O Brasil, Renata, dispensou R$ 390 bilhões de rico, de barão, em Refis, que é o refinanciamento de dívida de rico, e ninguém diz nada. Para refinanciar uma fração mínima disso, com crédito, não estou botando um centavo de dinheiro público, é um escarcéu. E agora está todo mundo vendo que é óbvio que é possível e necessário fazer. E eu estudei isso para fazer.
Renata Vasconcellos: Candidato, eu vou passar agora para um tema que também é muito caro para os brasileiros, que é segurança pública. Durante o governo do seu irmão, o Cid Gomes, que é o seu coordenador de campanha e com quem o senhor divide ideias e projetos para o país, a violência se multiplicou no Ceará, né? Era o 19º estado mais violento do Brasil, passou para 2º nesse ranking da violência. Quais erros do seu grupo político o senhor pretende evitar, se chegar à Presidência da República?
Ciro Gomes: Não há propriamente erro. O problema é que chegaram no Ceará, desse tempo para cá, as facções criminosas.
Renata Vasconcellos: De 19º para 2º...
Ciro Gomes: É, chegaram as facções criminosas que estão em acordo com as autoridades em São Paulo. Em acordo com a impunidade com as autoridades do Rio de Janeiro. E Fortaleza e o Ceará viraram, porque têm dois portos e um aeroporto com grande fluxo turístico, viraram um eixo de saída de droga. E a nossa polícia que multiplicou por três o efetivo, todos os seus equipamentos, sua capacitação, academia. Tudo isso foi feito. Não tá na mão dos governos estaduais fazer isso. Isso é tarefa minha, presidente da República.
Renata Vasconcellos: Pois é, mas... Entendi. Mas uma das facções que mais atuam no Ceará, ela surgiu e se fortaleceu no estado nos últimos anos...
Ciro Gomes: Ela foi criada pelo PCC.
Renata Vasconcellos: Durante governos do seu grupo político. Eu volto a perguntar até do grupo... É, eu volto até a...
William Bonner: Do grupo adversário, não é candidato?
Renata Vasconcellos: Sim. A solução de inteligência...
Ciro Gomes: O PCC é instrumentalizado por esse GDE, que é o grupo da facção dos abestados.
Renata Vasconcellos: Exatamente. Que o senhor costuma chamar de facção dos abestados.
Ciro Gomes: Abestados porque estão tudo morrendo com 20 anos, 19 anos, para fazer o serviço desses PCCs, Comando Vermelho.
Renata Vasconcellos: Mas essa solução, isso que nós questionamos. Essa solução...
Ciro Gomes: Se você deixar eu falar, eu proponho.
Renata Vasconcellos: Claro, por favor. Mas essa solução de inteligência que o senhor propõe, ela falhou ou ela não foi usada?
Ciro Gomes: Não, ela não foi usada.
William Bonner: Não foi usada.
Ciro Gomes: Ela não foi usada. Porque a tradição da polícia do Ceará é aparato. É a ostensividade. Tanto que o Rio Grande do Sul hoje tem metade do efetivo que tinha quando eu era governador, com Alceu Collares. E o Ceará tem quase três vezes o efetivo que tinha quando eu era governador. Portanto, todo o investimento naquilo que é o tradicional foi feito. O susto lá é que a nossa polícia, evidentemente, não estava preparada para esse tipo de crime.
William Bonner: Ou seja, candidato...
Ciro Gomes: Facções criminosas – só um minutinho – e narcotráfico só serão eficazmente combatidos com o Governo Federal tomando para si essa tarefa. E esse é o meu compromisso. Eu, assumindo a Presidência da República, vou liberar metade do efetivo da Polícia Federal, que é excelente, e que hoje está amarrado carimbando papel em serviço burocrático.
Renata Vasconcellos: Mas essa federalização, entra governo, sai governo, nunca sai do papel, né candidato?
Ciro Gomes: É porque eu nunca fui presidente. Você vai ver comigo (risos).
William Bonner: Candidato, vamos seguindo, então, com a nossa entrevista aqui para falar agora também de outro tema que é importantíssimo na política que é...
Ciro Gomes: A gente não pode ser cético, não. O Brasil está machucadíssimo.
Renata Vasconcellos: Não. Por isso mesmo estamos perguntando.
William Bonner: Prossigamos...
Ciro Gomes: E eu volto a dizer. Sou um homem experiente, sou homem experiente. Eu não proponho coisas que eu não sei, que eu não seja capaz de fazer. Só quero uma chance do povo.
William Bonner: Vamos em frente então. A gente vai falar de aliança política. O senhor tem uma história partidária bem agitada...
Ciro Gomes: Trágica (risos).
William Bonner: Variada. O senhor já usou até esse termo. Começou no PDS, um partido que era de apoio aos militares no fim do regime militar. Já transitou pelo centro, já transitou pela social democracia dos tucanos e, hoje, o senhor se propõe a ser o candidato que vai unir as esquerdas brasileiras.
Ciro Gomes: O centro-esquerda, por favor.
William Bonner: Centro e esquerda brasileiros. No entanto...
Ciro Gomes: Tanto que escolhi Kátia Abreu, mulher extraordinária.
William Bonner: Chegamos ao ponto.
Ciro Gomes: Líder da economia rural no Brasil, para ser minha vice.
William Bonner: No centro talvez o senhor não tenha problemas. Mas, pelas ideias defendidas por Kátia Abreu, fica um pouco mais, talvez, difícil e desafiador, unir as esquerdas. Kátia Abreu já ganhou um apelido do Greenpeace, era Miss Desmatamento. A Kátia Abreu, por exemplo, defende teses que não são muito caras aos... São o oposto das teses caras defendidas pela esquerda. Por exemplo, o porte de armas. Ela é muito mais liberal, é a favor do porte de armas.
Renata Vasconcellos: Demarcação de terras indígenas.
William Bonner: Ela é contrária à demarcação, aumento da demarcação de terras indígenas. Então, quando ela se manifesta, e ela se manifesta muito, sobre esses temas, ela não cria um problema para o senhor no sentido de tentar unir as esquerdas?
Ciro Gomes: Se você tiver como premissa que a minha tarefa é unir as esquerdas, isso não tem explicação.
William Bonner: O senhor se apresentou assim na campanha.
Ciro Gomes: Nunca me apresentei assim, vai me desculpar. Eu sou candidato de um projeto nacional de desenvolvimento que está amadurecido com o que há de mais preparado, mais inteligente, melhor informado no Brasil e no mundo sobre o Brasil. Passei os últimos três anos consultando essas inteligências e esse projeto está bem ordenado. Ele quer reunir concretamente os interesses de quem produz com os interesses de quem trabalha, e elege como grande adversário do conjunto da sociedade brasileira a especulação financeira e o baronato do rentismo. Então, esse é o desenho. Tem uma proposta de retomar o consumo das famílias pela superação do endividamento, projeto Nome Limpo, tem um programa para restaurar o investimento do empresariado, que também está colapsado, através da descartelização do sistema financeiro, que opera hoje tudo combinado, cobrando as taxas de juros mais imorais, destruindo (...), 13 mil indústrias foram fechadas no Brasil, do desmonte do governo Dilma para cá. Duzentas e vinte mil lojas, dos últimos anos para cá, nos últimos três anos, foram fechadas. Isso nos traz a 13 milhões e 700 mil desempregados, 32 milhões de pessoas absolutamente entregues a viver de bico. Sessenta e três milhões humilhados pelo SPC. Consertar conta pública é outra grande, específica e detalhada tarefa que está no meu programa de governo.
William Bonner: Candidato...
Ciro Gomes: E uma retomada da industrialização, que o Brasil está destruindo. Então, esse conjunto de providências precisa unir os interesses práticos de quem produz. E a Kátia Abreu vem para cá não é porque é igual a mim, mas porque é diferente. A Kátia Abreu vem porque é mulher, séria, trabalhadora, veio de uma vida linda. Aos 25 anos ficou viúva, com um filho na barriga e dois na mão.
William Bonner: E há coerência em ter Kátia Abreu na sua chapa? O senhor disse aqui que não tentou se aliar ao Partido dos Trabalhadores e ao ex-presidente Lula.
Ciro Gomes: Não, não é que eu não tentei. Isso nunca esteve disponível.
William Bonner: Não, o senhor disse também que nunca tentou ser o candidato de união das esquerdas.
Ciro Gomes: Sim, porque...
William Bonner: Embora isso tenha sido dito desde o início.
Ciro Gomes: Não por mim.
William Bonner: Mas agora o senhor tem Kátia Abreu, então, em relação ao centro, a minha pergunta é: em relação ao centro, parece não haver problemas. Realmente, com esse cardápio de temas que o senhor está elencando.
Ciro Gomes: Não, isso são caricaturas. Ela é uma pessoa que conhece a economia rural brasileira como poucos. Foi uma Ministra da Agricultura, votou contra o impeachment, votou contra o golpe, votou contra a reforma trabalhista selvagem que está destruindo a relação de trabalho no Brasil, votou contra...
William Bonner: Mas ela disse ainda outro dia que o senhor não é contra a reforma trabalhista.
Ciro Gomes: Nós queremos uma reforma trabalhista nova, mas uma que respeite o trabalhador, que proteja o lado mais fraco dessa relação selvagem do capital de trabalho.
William Bonner: Vocês estão de pleno acordo, o senhor e Kátia Abreu, sobre como tratar a reforma trabalhista?
Ciro Gomes: Estamos de pleno acordo que nós nos completamos. Estamos de pleno acordo que nós nos completamos.
William Bonner: Então não há incoerência?
Ciro Gomes: Veja, parece o Lula com Zé Alencar, Bonner? Não parece o Lula com o Zé Alencar? O Lula, uma pessoa reconhecidamente de esquerda, e o Zé Alencar, um homem que foi acusado de...
William Bonner: Foi a sua inspiração para buscar o apoio de Kátia Abreu?
Ciro Gomes: Não, isso é a realidade brasileira. Nós precisamos encerrar essa luta odienta que está se transformando em violência entre coxinhas e mortadelas. O Brasil não aguenta mais isso, nossa nação está indo para o brejo. Nós precisamos fazer tudo que esteja ao nosso alcance para fazer dessa campanha uma reunião da nação brasileira, porque nós temos que arregaçar as mangas e criar oportunidades, para tomar os nossos jovens da violência, do narcotráfico, para educar o filho do trabalhador, para dar de volta o mínimo de dignidade aos endividados, às pessoas que estão desempregadas. Isso é a minha obsessão.
Renata Vasconcellos: Vamos agora falar de um outro tema bastante importante para o país que é a governabilidade, a capacidade de fazer alianças. O senhor costuma relembrar a sua experiência como prefeito, governador, deputado, para se mostrar ao eleitor como um político experiente. Mas, na campanha, nós assistimos justamente à sua dificuldade em fazer alianças. Dificuldade essa que alguns analistas políticos atribuem a uma pouca habilidade em negociar, tanto é que o seu partido não conseguiu um vice de um outro partido, formou uma chapa única, com a sua vice do seu partido, o senhor se coligou com o Avante, um partido minúsculo. O que o senhor pretende mudar, se eleito, para conseguir negociar projetos importantes para o país no Congresso?
Ciro Gomes: O presidencialismo brasileiro traz essa semente desse impasse. Para mim e para qualquer um. Não por acaso, o líder das pesquisas sem o Lula é o Bolsonaro, também está isolado. A Marina, que está ali junto comigo no segundo ou terceiro lugar, também pegou um partido pequeno. Por quê? Porque as estruturas, os mecanismos tradicionais, essa confrontação do PSDB com o PT e toda ferramentaria de poder, de grana, de ladroeira que eles manipulam é muito poderosa. Agora, eu mostro para a população que eu não sou uma pessoa que chegou ontem e que não sabe manejar essas coisas. E aí como é que eu estou propondo?
Renata Vasconcellos: Como é que o senhor vai convencer justamente o eleitor que depois de eleito o senhor vai consegui manejar?
Ciro Gomes: São três providências e um fusível.
Renata Vasconcellos: Um fusível?
Ciro Gomes: Um fusível para desativar esse curto-circuito. Primeiro, propor antes. Levar as bordoadas, enfim, propor com grande clareza. Se você olhar, sou eu que estou propondo imposto para os mais ricos, sou eu que estou propondo descartelizar, ou seja, acabar com "combinemos" de juros dos bancos. Por quê? Porque eu sei que isso vai me levar a levar muita pancada. Se eu escapar, escapo eu e a ideia. Então, nós damos um conteúdo plebiscitário à eleição e não um fulano de tal. Caudilhismo... Está virando até religião no Brasil esse negócio que tá acontecendo aí. Segundo: propor na primeira hora. Todos os presidentes têm poderes quase imperiais nos seis primeiros meses, então eu vou propor na primeira hora durante seis meses, para tirar o medo, mediar os conflitos, trazer universidade, a legislação internacional comparada... Enfim, está tudo bem proposto. Terceiro: redesenhar o entendimento fiscal brasileiro, ou seja, consertar as contas públicas, em troca de um redesenho do pacto federativo. Hoje os estados estão quebrados, os municípios estão quebrados. Veja o Rio de Janeiro, vejo o Rio Grande do Sul, veja Minas Gerais, que são só a ponta do iceberg de um dizimado em condição de operar dos estados. Então, se você trocar o centro de gravidade do Brasil na política, não está em Brasília, está na Federação. E o fusível: chamar o povo para votar. Persistiu o impasse, plebiscitos e referendos.
William Bonner: Candidato, nosso tempo está chegando ao fim...
Ciro Gomes: Que pena...
William Bonner: É, passou rápido. Eu vou pedir ao senhor então que diga aos eleitores, telespectadores brasileiros, qual é o Brasil que o senhor quer para o futuro. Em um minuto.
Ciro Gomes: Eu quero um Brasil em que todos possamos viver pela dignidade do suor do nosso rosto, que toda mãe e todo pai possam ter o filho guardado em uma escola em tempo integral, protegido das ameaças da rua, um país em que a política não seja o signo da corrupção, da ladroeira e do privilégio. E eu me preparei para isso. Eu sonho a vida inteira em servir ao Brasil. Nunca me interessei por dinheiro, não tenho interesses práticos nem pragmáticos. Me dediquei a vida inteira a construir esse projeto. E eu peço a Deus que abençoe esta grande nação e que ela possa escolher na hora própria o seu futuro presidente.
William Bonner: Candidato Ciro Gomes, muito obrigado pela sua presença aqui, esclarecendo as questões todas do Jornal Nacional. Eu quero dizer também ao público em casa que os 27 minutos de entrevista propriamente dita serão replicados ao longo da semana com os demais candidatos, porque esse foi o tempo da entrevista inicial. Agradeço o senhor mais uma vez.
ESCLARECIMENTO: Nós começamos a edição do Jornal Nacional desta segunda-feira (27) com uma entrevista com o candidato à presidência, a primeira entrevista da semana, e antes de encerrar vamos reforçar a informação que demos numa pergunta dirigida ao candidato Ciro Gomes e posta em dúvida por ele.
Como nós dissemos, o presidente do PDT, Carlos Lupi, é réu. É na ação civil de improbidade administrativa número 27594 – 86.2012.4.01.3400, que corre na 6ª Vara Federal de Brasília.
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