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Imagine se Camaçari inteira fosse habitada apenas por pessoas em situação de rua. Essa é, em escala nacional, a realidade brasileira hoje. De acordo com levantamento do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua (OBPopRua), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o país tem atualmente 335.151 pessoas vivendo nas ruas — número superior à população total de Camaçari, que, segundo o Censo de 2022, tem 300.372 habitantes.
Desse total, 9.933 são crianças e adolescentes. A maior parte, no entanto, é composta por adultos entre 18 e 59 anos, que representam 88% do total. Os idosos correspondem a 9%. O perfil predominante é de homens (84%), negros e com baixa escolaridade. Mais da metade das pessoas em situação de rua no país não concluiu o ensino fundamental ou sequer teve acesso à escola. É um índice que mais que dobra a média nacional, de 24%, de pessoas que não terminaram a educação básica, segundo o IBGE.
A extrema vulnerabilidade dessa população se reflete também na renda. O levantamento aponta que 81% dos cadastrados no CadÚnico sobrevivem com até R$ 109 por mês, o que representa apenas 7,18% do salário mínimo atual, de R$ 1.518.
A desigualdade racial é outro dado que chama atenção. A maioria das pessoas em situação de rua é negra, o que reforça os impactos históricos do racismo estrutural nas oportunidades de vida e acesso a direitos. Como destacou o relatório, a baixa escolaridade e a exclusão social dificultam o acesso ao mercado de trabalho, perpetuando o ciclo da pobreza.
Em termos geográficos, a maior concentração dessa população está no Sudeste (63%), com destaque para São Paulo, que sozinho abriga 42,8% das pessoas em situação de rua no Brasil. A Região Nordeste aparece em segundo lugar, com 14% (48.374 pessoas). A Bahia, estado mais populoso do Nordeste, registra estabilidade nos números — ou seja, não teve aumento nem redução no total de registros —, mas sua capital, Salvador, está entre as cinco cidades brasileiras com maior número de pessoas em situação de rua: são 10.025, segundo dados de março de 2025.
Para efeito de comparação, Salvador tem mais pessoas vivendo nas ruas do que Brasília (8.591), mesmo com uma população menor. Considerando a proporção por mil habitantes, cidades como Boa Vista (20 a cada mil), São Paulo (8), Florianópolis (7) e Belo Horizonte (6) apresentam os maiores índices.
A violência contra essa população também é alarmante. Entre 2020 e 2024, o Disque 100, do Ministério dos Direitos Humanos, recebeu 46.865 denúncias de agressões contra pessoas em situação de rua. Mais da metade ocorreu nas capitais, principalmente em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. As agressões aconteceram, em sua maioria, nas vias públicas — mas também em locais que deveriam oferecer proteção, como abrigos, unidades de saúde e órgãos públicos.
O cenário retratado é grave. Em nota divulgada à imprensa, o OBPopRua afirmou que “as políticas públicas estruturantes como moradia, trabalho e educação voltadas para a população em situação de rua no Brasil são inexistentes ou ineficientes”. O observatório conclui que há um descumprimento sistemático da Constituição Federal no que diz respeito aos direitos básicos dessas pessoas.
O Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), por sua vez, informou que retomou em 2023 as capacitações de entrevistadores do CadÚnico e que tem investido na ampliação dos Centros POP — unidades que oferecem refeições, banho, emissão de documentos e outras formas de acolhimento —, além do custeio de programas de atendimento especializado. No entanto, os números mostram que o problema está longe de ser resolvido.
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