Projeto de lei orçamentária prevê redução de 18,32% no orçamento da Ufba em relação ao de 2020
Após sofrer reduções orçamentárias por três anos consecutivos, a Universidade Federal da Bahia (Ufba) corre o risco de sofrer um novo corte em 2021 em suas despesas discricionárias, que são os custos com a manutenção da universidade e a principal fonte de assistência estudantil. Dessa vez, a diminuição será de 18,32% em relação ao orçamento de 2020, ou seja, serão aproximadamente R$ 30 milhões a menos. O valor total reduzirá de R$ 163.309 milhões para R$ 133.385 milhões, orçamento menor que o de 2011 e que não tinha sido visto desde então. Naquele ano, a universidade recebeu R$139.503 milhões do Ministério da Educação (MEC).
De acordo com a Ufba, os dados estão no sistema do orçamento, por onde o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) é apresentado todos os anos. Em nota, o MEC justificou a redução à universidade: “Em razão da crise econômica em consequência da pandemia do coronavírus, a administração pública terá que lidar com uma redução no orçamento para 2021, o que exigirá um esforço adicional na otimização dos recursos públicos e na priorização das despesas”, escreveu a pasta.
Caso esse orçamento seja aprovado, representaria um regresso orçamentário de 10 anos, quando a Ufba tinha menos alunos, menos professores e menos espaço físico para gerenciar. Esses detalhes foram apresentados durante uma transmissão feita pela TV Ufba, na manhã desta quinta-feira (13), com a participação do reitor João Carlos Salles e do professor Eduardo Mota, pró-reitor de Planejamento e Orçamento (Proplan).
“O orçamento previsto para 2021 nos remete ao de 10 anos atrás. Iremos retornar a valores inferiores aos de 2011. Isso é absolutamente insustentável”, observou o pró-reitor (veja o gráfico).
Orçamento de despesas discricionárias da UFBA de 2010 a 2019
Pelo aumento que ocorreu na estrutura da Ufba nos últimos anos, não teria como o orçamento ser reduzido, segundo a universidade. De 2013 a 2019, o número de cursos de graduação e pós-graduação cresceu 9,5%, saindo de 221 para 243 cursos ofertados. São hoje 38,8% mais alunos matriculados na graduação do que em 2010, e 78,7% a mais nos cursos de pós-graduação.
A nova área construída cresceu em 23 mil metros quadrados de 2015 para 2019, o que representa um aumento de mais 750%. Houve ainda um acréscimo de 120% na quantidade de artigos científicos publicados desde 2010.
A diferença de R$ 30 milhões prevista para o ano que vem equivale a 3 meses de despesas administrativas, segundo a Proplan. Ou seja, a Ufba não teria como pagar, durante um trimestre, manutenções na estrutura dos prédios dos campi, além das contas de água, luz, internet, serviços de limpeza e segurança - isso sem contar com os custos dos auxílios aos estudantes, além das atividades de pesquisa, como bolsas para iniciação científica, e atividades de extensão, como estágios.
Se o valor fosse corrigido pela inflação (baseado no IPCA), a situação é ainda mais grave: o orçamento para 2021 deveria ser de R$ 257 milhões, ou seja, 93% maior do que o sugerido pelo Projeto de Lei Orçamentária. É a maior defasagem dos últimos 10 anos. “A diferença entre o valor ajustado pela inflação e aquilo que se propõe a lei orçamentária do próximo ano, chega a mais de R$ 123 milhões. Seria o máximo dessa defasagem”, pontua Mota. Já o orçamento total da Ufba, incluindo emendas parlamentares, é da ordem de R$ 1,7 bilhão.
Auxílio aos estudantes
Além dos custos com o funcionamento da universidade, os principais impactados com a redução das despesas discricionárias seriam os estudantes, principalmente os que recebem os auxílios da Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil (Proae) da Ufba. São mais de 20 tipos de assistência que beneficiam mais de 8.865 dos 44.658 alunos - quase 20% da comunidade discente - a exemplo do auxílio-moradia, residência, creche, restaurante universitário (RU), esporte, transporte e material didático.
Umas das beneficiadas é a estudante Laiz Menezes, que é de Itaberaba, interior da Bahia, e pôde continuar a estudar na Ufba após conseguir uma vaga em uma das residências universitárias, em Ondina. O auxílio-residência permite que ela tenha um lugar para morar, sem nenhum custo, como luz, água, gás e internet; possa almoçar e jantar de graça no RU; e receber R$ 230 por mês para o café da manhã. Sem isso, seria inviável para Laiz estudar jornalismo na capital baiana.
“Como sou do interior, eu não conseguiria morar em Salvador para estudar sem a residência, não teria como ficar. Eu teria que voltar para Itaberaba”, diz a estudante.
A pró-reitora da Proae, Cássia Maciel, mostra a importância dessas políticas de auxílio devido à maioria dos estudantes não ter grandes condições financeiras. “Hoje a Ufba, com cerca de 38 mil estudantes de graduação, tem 70% de seus estudantes que informam renda familiar per capita abaixo de um salário mínimo e meio. Deste contingente, 60% são compostos por mulheres e a maioria por mulheres negras. Isso demonstra para nós um impacto social promovido pela universidade”, mostra a pró-reitora.
‘Reduzir recursos é agravar a situação’, diz pesquisador
As pesquisas científicas na universidade também sofreriam com o corte, como as do professor e pesquisador Nelson Pretto, pós-doutor em educação e professor da Faculdade de Educação da Ufba (Faced). “Essa é mais uma maldade com as universidades públicas, é não ter respeito para com a ciência e com a educação. Propor, neste momento, uma redução dos recursos é agravar a situação das nossas universidades” protestou o pesquisador.]
“A situação atual das universidades já é muito difícil. Temos uma quantidade enorme de prédios inacabados. É também deficitária a infraestrutura para tecnologia de informação, a manutenção dos prédios, do ar-condicionado, rede elétrica, sanitários… Se hoje já estamos nessa situação, com o corte, vamos ter que nos vender a essa situação desesperadora e dramática. Será o fim da autonomia das universidades”, critica Nelson Pretto.
A presidente da Apub (Associação dos Professores Universitários da Bahia), a professora Raquel Nery, afirma que, se a política de redução de orçamento continuar, é capaz de a Ufba não conseguir mais pagar nem as despesas obrigatórias, como os salários dos professores e servidores públicos.
“Se essa política vai se confirmando ao longo do tempo, você vai em breve comprometer as despesas obrigatórias, assim como a carreira dos professores, suas progressões de salário, a contratação de um professor novo ou professor substituto. Isso traz uma série de consequências para o funcionamento da universidade”, argumenta Nery.
Em nota, o Ministério da Economia respondeu que “o prazo para o Poder Executivo enviar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA-2021) para apreciação do Congresso Nacional é até 31 de agosto de 2020. Até lá, as propostas orçamentárias e as solicitações de expansão de limites demandadas pelos órgãos serão analisadas e submetidas à decisão da Junta de Execução Orçamentária. Nesse sentido, a Secretaria de Orçamento Federal não possui, nesta data, elementos conclusivos para informar os valores dos limites finais das despesas dos órgãos que constarão do PLOA-2021”.
Procurado, o Ministério da Educação não retornou até a publicação desta reportagem.
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