Segundo o MEC, CLT será obrigatória para as federais que entrarem no novo programa
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, vai estimular as universidades federais a contratarem professores e técnicos pelo regime CLT (de carteira assinada). Hoje, eles passam por concurso público e têm direito à estabilidade. A contratação via CLT será exigência para a entrada das universidades no Future-se, novo programa do MEC que vai captar recursos junto à iniciativa privada. Segundo a pasta, boa parte dos novos investimentos no ensino superior federal será pelo programa.
No Future-se, cuja adesão das universidades é facultativa, contratos de novos docentes e técnicos serão intermediados por Organizações Sociais (OSs), entidades privadas que prestam serviços públicos e não precisam seguir a Lei de Licitações e Concursos. Embora Weintraub afirme que os funcionários seguiriam com estabilidade, o Supremo Tribunal Federal decidiu, em 2018, que empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista regidos pela CLT não fazem jus à estabilidade prevista na Constituição. No novo modelo das federais, ainda não detalhado, a ideia é o servidor ter a permanência atrelada ao desempenho.
Um dos ministros mais próximos ao presidente Jair Bolsonaro, Weintraub argumenta que é preciso cortar o gasto na folha de pagamento, que chama de “bomba-relógio”. Estudos do Ministério da Educação mostram que 85% da verba nas federais é gasta com pessoal.
O MEC anunciou que conseguiu R$ 600 milhões para descongelar 3.182 bolsas de pós-graduação. De onde vem o dinheiro?
O que acontece é que o teto (federal de gastos) estrangulou a gente. O pessoal aprovou esse teto pensando que ia passar a (reforma da) Previdência e diminuir despesas. Só que não passou no governo (Michel) Temer. Agora, a gente passou a Previdência (na Câmara)e vai diminuir despesa. Mas a gente vai ser estrangulado no ano que vem. A forma de conseguir mais espaço no orçamento é achando nas despesas obrigatórias coisas não tão obrigatórias assim.
De que forma?
Mandamos documento ao Ministério da Economia. O valor era de R$ 16 bilhões de despesas discricionárias, me matava. Buscamos junto com a Economia soluções nesse sentido. Coisas vistas como “não tem jeito”. Tinham jeito, em busca de eficiência. Conseguimos mais R$ 5 bilhões. Subiu para R$ 21 bilhões. Agora apareceram mais R$ 600 milhões (para oferta de bolsas em 2020).
Como o governo conseguiu abrir espaço no teto (de gastos)?
Quem mostrará de onde saiu é o Ministério da Economia. Conseguimos trabalhar de forma mais assertiva e eficiente.
Esses recursos para as bolsas da Capes atendem à demanda?
A demanda é infinita. Todo mundo quer uma bolsinha. No Brasil, todo mundo acha que o dinheiro cai do céu. Na verdade, vem do pagador de imposto. O Brasil quebrou e agora temos que respeitar o limite orçamentário.
O sr. pretende abrir espaço para aumentar os recursos para outras áreas do MEC?
Vou encontrar mais (espaço). Desde o começo, temos dito que é contingenciamento. Disseram: “é corte!”; “Vai parar tudo!”. Mentira.
Sua declaração ao Estado de que havia “balbúrdia” nas universidades causou desconforto.
É para causar. É dinheiro público, do pagador de imposto, que poderíamos fazer creches. Disse que a gente ia contingenciar e que, se tudo desse certo, a partir de setembro começava a descontingenciar. É o que está acontecendo.
O sr. disse que aquelas universidades que tinham “balbúrdia” não teriam recursos.
As universidades são caras e têm muito desperdício com coisas que não têm nada a ver com produção científica e educação. Têm a ver com politicagem, ideologização e balbúrdia. Vamos dar uma volta em alguns campus por aí? Tem cracolândia. Estamos em situação fiscal difícil e onde tiver balbúrdia vamos pra cima.
Conseguiu administrar a falta de recursos em universidades?
Me diz um caso? Não faltou (recurso). Todo dia estou buscando solução numa crise dessa dimensão. O objetivo final não é gastar. O objetivo final é melhorar a educação.
E o que vai priorizar em 2020?
Dificilmente terá contingenciamento. Eles poderão estimar. Mas presta atenção porque a folha de pagamento de todas as universidades cresce 8% ao ano, acima da inflação. Uma bomba-relógio. O Future-se é um caminho. Hoje, no governo federal, tem 600 mil funcionários públicos na ativa, e, desses, 300 mil no MEC. De 300 mil, 100 mil foram nos últimos anos do PT.
Como será resolvido o problema da folha de pagamento?
O Future-se tem várias características. Uma delas é o modelo da Ebserh (autarquia do MEC que gere hospitais universitários federais), que são novas contratações via CLT. Com isso, pode preservar contratos atuais e ir gradualmente trocando, o que se tem na FGV (Fundação Getúlio Vargas).
O sr. falou em ir “gradualmente trocando” as contratações atuais pelo regime CLT...
É como a Ebserh... Quem é concursado, e sou (ele é professor da Universidade Federal de São Paulo), já passei na estabilidade, sou funcionário público concursado pelo resto da vida. Somos contra ruptura, a favor de respeitar leis e contratos. Vamos conduzir tudo dentro da lei, dos contratos, respeitando a Constituição.
Mas a ideia seria fazer transição aos poucos ao regime CLT?
As novas vagas (seriam) CLT, como é na Ebserh. A pessoa vai ter estabilidade, vai ter tudo. O objetivo não é ser uma universidade privada, é pública. Na Ebserh, você não tem uma rotatividade tão grande.
Então, com o tempo, as vagas por CLT seriam priorizadas?
Não seriam priorizadas, seriam a norma. As faculdades e universidades que aderirem ao Future-se vão ter de passar a contratar via CLT e não mais via concurso público, um funcionário público com regime jurídico único.
O MEC vai tirar dinheiro das universidades?
Não vou tirar. A gente vai manter o que está mandando, como estamos fazendo para o ano que vem. E aí vou trabalhar para conseguir mais recursos para viabilizar outras coisas, outras áreas, projetos novos. Dá para fazer muita coisa com pouco dinheiro.
O governo vai mudar a forma de distribuição de recursos para universidades (em agosto, o MEC disse que estuda indicadores como governança e empregabilidade para dar verba às federais)?
Pela primeira vez buscamos eficiência. Antigamente, falava: “tem de mandar mais recursos para educação”. Hoje não. O objetivo é melhorar indicadores de educação. Mandou rios de dinheiro, bilhões, e não melhoramos os índices. As nossas universidades não estão bem ranqueadas.
Mas serão adotados outros indicadores para a distribuição de recursos?
Vai ser adotado. As pessoas vão ter que performar. Vou te dar um exemplo. Um diploma hoje em uma universidade federal, da primeira a última mensalidade custa, na média, R$ 450 mil para o pagador de imposto. Na ponta do lápis, a relação custo-benefício não está boa para a sociedade. E é isso que eu vou mostrar, estou mostrando, e tem gerado um grande desconforto.
É favorável à cobrança das universidades para quem pode pagar?
Sou contra. É burrice cobrar. Pelo seguinte, dos 100% de alunos das federais, dois terços são de escola pública e um terço é de escola privada. Só que escola privada de R$ 700, R$ 1000 de mensalidade. Tem 10% que vem de família que pode pagar. Só que desses 10%, que é o meu caso, eu tenho condições de pagar, meu filho entra na FGV e na federal de Minas Gerais, conta para mim, onde ele vai estudar? Lógico que não vai ser na federal de Minas. E se não for, vai estudar em Portugal, porque é mais barato do que a federal de Minas, ou vai estudar no Chile, ou vai estudar fora do Brasil, mas a relação custo benefício está totalmente desbalanceada. E a gente começa a mudar isso com o Future-se.
Qual a sua avaliação sobre a retomada da economia?
Todos os dados estão positivos. Como ex-economista chefe, diria que (a economia) já pegou. Agora é só não fazer alguma coisa errada tipo não passar a reforma da Previdência no Senado. Vamos ter crescimento de 2,5 a 3% no ano que vem.
O presidente Jair Bolsonaro não está incomodado com a retomada mais lenta?
Não está. Te afirmo isso. Sou um ministro que tem hoje certa proximidade. Eu diria que hoje ele está bem otimista.
Future-se mira verba privada
O programa Future-se foi apresentado pelo MEC em junho como uma proposta de modernizar a gestão das 63 universidades federais do País e criar alternativa para a crise orçamentária das instituições. São previstos R$ 102,6 bilhões em incentivos para a captar recursos privados – como doações, parcerias com empresas, aluguel e venda de patrimônio público, “naming rights” e uso da Lei Rouanet.
Parte da comunidade acadêmica vê no projeto ameaça à autonomia das instituições. Reitores temem ainda haver corte de repasses do governo nos próximos anos e negam desperdício de dinheiro, como acusa o ministro. Especialistas dizem que diversificar fontes de recursos é bom, mas ainda apontam lacunas na proposta.
Algumas instituições – como as federais do Rio e de Brasília – já se manifestaram contra o novo programa do MEC. O texto do Future-se ainda será enviado pelo governo ao Congresso.
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