Em menos de um mês, soteropolitanos de diversos bairros viram as torneiras secas duas vezes. Ontem, o abastecimento de água voltou a ser interrompido em Salvador. Dessa vez, a Empresa Baiana de Água e Saneamento (Embasa), vinculada ao governo do estado, suspendeu o fornecimento em 106 locais de Salvador e cinco cidades da Região Metropolitana, das 8h às 16h.
Inicialmente, a previsão era de que 44 localidades ficassem sem o recurso por causa da manutenção de tubulações do centro de reservação situado no Cabula, mas o número de locais afetados subiu após um vazamento na adutora principal de água tratada. Nas quatro interrupções ocorridas neste ano, 64 localidades foram afetadas em três delas, segundo levantamento feito pelo CORREIO. Ao todo, 162 localidades ficaram sem água este ano na capital baiana.
A Embasa explicou que o vazamento ocorreu em um equipamento chamado ventosa, que integra a estrutura da adutora, e serve para entrada e saída de ar. A empresa justificou que, como se tratava de uma manutenção na tubulação, foi necessário interromper o fluxo de água para possibilitar o reparo. Sendo assim, “a consequência do vazamento para a população foi a interrupção temporária do fornecimento”, diz nota.
Prejuízo
O problema é que, sempre que isso acontece, há um impacto não apenas nas atividades do dia a dia, mas também na micro e, consequentemente, na macroeconomia da cidade.
Em Pirajá, uma das localidades atingidas pela interrupção, a qualidade das quentinhas servidas diariamente pela cozinheira Ana Cláudia Bacelar, 39 anos, teve uma queda por causa da falta de água, deixando o caldo do cozido mais grosso. “Além de engrossar o caldo, a casa está uma bagunça, as roupas se acumulando e os pratos sujos na pia”, reclama Cláudia.
A previsão era de que o serviço só terminasse amanhã, mas, no final da tarde de ontem, a Embasa informou através de nota que os trabalhos de manutenção e correção do vazamento tinham sido concluídos e que o abastecimento seria retomado gradativamente, em até 48 horas, em todas as localidades atingidas.
No entanto, de acordo com Cláudia, a torneira tem ficado seca com frequência desde fevereiro e, mesmo com um reservatório de 500 litros, ela ainda tem que recorrer à fonte natural do Parque São Bartolomeu. Para preparar as quentinhas, ela se preveniu: encheu cinco baldes no dia anterior.
“Anunciaram na sexta-feira que a água faltaria na segunda (ontem), mas aqui ela foi embora no sábado mesmo”, denuncia a irmã da cozinheira, a merendeira Bárbara Bacelar, 45.
Vizinhança
Por causa da recorrente falta de água, muita gente tem que se virar apelando para as amizades. Na Rua Voluntários da Pátria, no Lobato, quando a água deixa de cair, todo mundo já sabe a quem recorrer.
O garçom Luiz Carlos Batista, 60, é quem tem tirado a vizinhança do aperto em dias de escassez. Há 45 anos, um poço artesanal foi descoberto no quintal da casa dele e, até hoje, ele socorre os moradores do bairro, enchendo baldes.
“Quando falta água, eu costumo deixar o portão aberto para quem quiser entrar. Uma vez, teve tanta gente aqui que a fila dobrou a esquina”, lembra.
No Lobato, outra cozinheira também sentiu a secura. Dona de um restaurante na Suburbana, Édila dos Santos, 64, se preocupa com o futuro do negócio. No estabelecimento há dois tanques de mil litros, mas, segundo ela, a quantidade só é suficiente para dois dias. “Ano passado, ficamos fechados por oito dias. Se continuar assim, vamos ter que fazer o mesmo”, diz ela.
Sobre a situação do bairro, a Embasa afirmou que o abastecimento vinha ocorrendo com regularidade lá e também no São Bartolomeu. A companhia acrescentou que, em locais densamente povoados de Salvador – em especial nos bairros que possuem alto número de ligações clandestinas – as pressões na rede de distribuição podem sofrer redução durante o dia, quando o consumo é maior, o que dificulta o abastecimento dos imóveis que não têm reservação adequada.
Recorrente
Este ano, o abastecimento de água em Salvador já foi suspenso quatro vezes. No dia 30 de janeiro, 142 locais da capital ficaram sem o recurso por conta de serviços de manutenção na principal Estação de Tratamento de Água, em Candeias.
Mas foi em abril que a população passou mais dias sem água caindo nas torneiras. Foram cinco dias com o fornecimento interrompido das 4h às 18h - entre 17 e 21 de abril - e, embora a falta d’água tenha durado cinco dias, a previsão era de apenas dois. A suspensão foi para a implantação de um sistema de transposição de águas da represa Pedra do Cavalo para Joanes II.
De acordo com a Embasa, a estiagem reduziu muito o nível de água deste último manancial, tornando necessária a obra para prolongar o tempo de atividades da represa.
Uma semana antes, a Embasa havia alertado para a possibilidade de racionamento devido aos baixos níveis dos mananciais que abastecem a capital e a RMS. Na época, a barragem de Pedra do Cavalo, responsável por abastecer 60% de Salvador, estava com 62,88% de sua capacidade total de acumulação.
O nível subiu apenas 0,66%, para 63,54%. O restante do sistema é abastecido por Joanes I (93,26%), Joanes II (44,98%), Santa Helena (60,57%), Ipitanga I (43,66%) e Ipitanga II (45,12%).
Outra interrupção atingiu Pituba e Itaigara em março, após um vazamento na linha que atende à região. Ontem, a empresa ressaltou que nenhuma das interrupções deste ano atingiu a totalidade do município e que a quantidade de áreas afetadas depende do equipamento alvo de manutenção.
A Embasa acrescentou, ainda, que muitos moradores não sentiram a falta de água, pois os imóveis contam com reservatório compatível com as necessidades de consumo e lembrou que, por lei, é dever do consumidor possuir tanque disponível para enfrentar situações como essas.
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