Um projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa da Bahia sugere proibir o uso de algemas em detentas durante o trabalho de parto. Apesar de o texto visar garantir um parto humanizado às presas nas unidades prisionais da Bahia, o Estado sustenta já haver abdicado dessa prática há, pelo menos, duas décadas.
De autoria do deputado Zó (PCdoB), o texto se assemelha ao decreto sancionado no último dia 8, no Rio de Janeiro, pelo governador Luiz Fernando Pezão, que ratificou o Projeto de Lei 504/2015, proposto pela bancada do PSOL, para proibir a contenção física de presas durante o parto.
A proposição virou lei naquele estado após a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, Maria do Carmo Leal, divulgar o estudo Nascer no Brasil: Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Leal entrevistou 495 mulheres em situação de maternidade nos presídios de todas as capitais do Brasil, quando ouviu das detentas diversos relatos de violações dos direitos humanos, como partos ocorridos em celas e mulheres algemadas pelos quatro membros no momento de dar à luz.
"Além da retirada das algemas no parto, é importante pensar em formas alternativas de as grávidas cumprirem pena, como a prisão domiciliar", diz a baiana radicada no Rio. "O ambiente nas prisões é insalubre tanto paras as mães quanto para as crianças", ela completa.
Segundo a pesquisadora, o estudo observou, também, que, em 80% dos casos, as detentas sequer haviam sido julgadas. "A maioria é presa por pequenos delitos. Muitas por portar pequenas quantidades de drogas ou por levá-las à prisão para os companheiros ou guardá-las em casa", disse.
O proponente do projeto baiano argumenta que o texto tem o objetivo de colaborar com a ressocialização das detentas. "Detentas parturientes não oferecem risco de fuga ou aos profissionais de saúde. A ideia é tornar lei o que depende do critério das unidades prisionais", sustenta Zó.
Tráfico
Das 126 detentas no Presídio Feminino, em Salvador, até a última sexta-feira, 68 estavam ali por tráfico de entorpecentes. Destas, 41 ainda estavam na fase processual, enquanto somente 27 haviam sido condenadas pelo comércio de drogas.
Esse foi o motivo pelo qual uma mulher de 24 anos, cuja identidade foi preservada, faz sua terceira passagem em uma unidade de segurança. Presa com dois meses de gestação, foi transferida para a capital com sete, onde permaneceu até parir um menino em dezembro.
O segundo rebento veio após uma cesariana, na Maternidade Tsyla Balbino, na Baixa de Quintas, para onde foi levada de ambulância. Já o mais velho, de 9 anos, vive com a avó materna na cidade de Valença, no baixo Sul do Estado.
"Durante a internação, não cheguei a ficar algemada, nem no parto. Apenas quando a equipe médica saía para fazer alguma coisa", afirmou, em contraponto ao que ocorre em outros estados. "Apesar da condição de presa, não me senti tratada com indiferença no hospital", completou.
Assim como ela, outra colega de pavilhão ouvida por A TARDE relata estar custodiada em uma cela a qual só divide com a criança. Esta, porém, presa pela quinta vez por envolvimento com furtos, já é mãe de cinco filhos, "cada um de um pai diferente".
Após seis meses, as crianças são levadas para a creche anexa ao presídio, informa a diretora da unidade, Luz Marina, mas o caçula da mulher de 33 anos já tem destino. "Mainha falou que vai criar ele, mas que eu tenho que tomar juízo", afirmou ela, presa há mais de um ano.
A mulher pariu de forma natural no Hospital Roberto Santos, onde tampouco a equipe médica solicitou o uso das algemas. Apesar do acompanhamento médico oferecido nos muros da prisão, ela diz que só fez pré-natal a partir dos sete meses, pois havia escondido a gravidez durante esse tempo.
"Além de não ter sido algemada a caminho do hospital, na ambulância, isso não ocorreu no parto", ela disse. "Na condição de presa, fui melhor tratada no hospital do que quando tive os outros filhos", concluiu.
< Anterior | Próximo > |
---|