Desde a Antiguidade se sabe que a expectativa de impunidade é o maior estímulo ao crime. No Brasil, os golpistas de 1964 e os agentes do Estado que violaram direitos humanos durante a ditadura militar jamais foram punidos; o resultado foi a ascensão da extrema direita, o golpe parlamentar de 2016, a prisão do Lula e a eleição de Bolsonaro em 2018, com a quase destruição da democracia nos quatro anos de governo do Inominável.
Até agora, a Justiça tinha processado e condenado apenas participantes da tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, os chamados “bagrinhos”, mas nenhum mandante, financiador ou articulador da intentona.
Mas nesta quinta-feira (08/02), o cerco começou a se fechar contra o Estado-Maior golpista: a Polícia Federal cumpriu 33 mandados de busca e apreensão nas casas do ex-presidente Jair Bolsonaro; de dois ex-ministros da Defesa, os generais Braga Netto e Paulo Sérgio Nogueira; dos ex-ministros Augusto Heleno e Anderson Torres, do ex-comandante da Marinha, Almir Garnier, além de dois integrantes do “gabinete do ódio”, que foram presos, e de outros funcionários menores, inclusive militares.
Até o presidente do PL, partido de Bolsonaro, o notório Valdemar da Costa Neto, acabou preso no episódio por porte ilegal de armas. O deputado, como é sabido, foi um contumaz leva-e-traz dos golpistas em 2022.
As revelações que estão sendo divulgadas até agora são estarrecedoras: a mais grave foi a comprovação de que o golpe estava sendo preparado bem antes da realização das eleições de 2022. A PF divulgou a transcrição de um vídeo de julho de 2022, aprendido na casa do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, que mostra o então presidente em uma reunião secreta com ministros (Braga Netto, Paulo Sérgio Nogueira, Anderson Torres, Augusto Heleno, entre outros), na qual eles discutiram a dinâmica do golpe.
“Eu não posso fazer nada sem vocês”, disse Bolsonaro aos militares. “Nós somos irmãos”. No vídeo, Bolsonaro insinua ainda que ministros do STF e do TSE estariam recebendo propina para fraudar as eleições e incita os militares e colaboradores a participar do golpe antes que seja tarde demais.
A PF revelou que Bolsonaro pediu alteração e aprovou a minuta do golpe que previa a convocação de novas eleições e a prisão do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes. Essa minuta depois seria aprendida na casa de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça.
Além disso, a PF apurou que Marcelo Câmara, um dos assessores de Bolsonaro que foram presos, monitorou Alexandre de Moraes com o objetivo de prendê-lo quando o golpe de Estado fosse desfechado.
Diálogos obtidos pelo celular de Mauro Cid revelam que o general Estevam Theophilo, um dos alvos da operação da PF, teria garantido a Bolsonaro que colocaria sua tropa na rua para apoiar um golpe de Estado. O general era chefe do Comando de Operações Terrestres (Coter), responsável pelo emprego das unidades militares do Exército.
As investigações revelaram também que o general Braga Netto atacou e ameaçou oficiais-generais que teriam se recusado a aderir ao golpe, como os então comandantes do Exército, general Freire Gomes; e da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Baptista Jr.
Já o comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, o único que teria topado participar da insurreição, foi elogiado por Braga Netto.
Em uma das reuniões com Bolsonaro, o general Augusto Heleno afirma que “se tiver que virar a mesa terá que ser antes das eleições”, dizendo ser necessário atuar “contra determinadas pessoas e determinadas instituições”.
O relatório da PF aponta também para aponta para uma “gravíssima manipulação” do relatório técnico das Forças Armadas sobre o sistema eletrônico de votação, postergando a divulgação depois que o documento não identificou vulnerabilidade nas urnas eletrônicas. O relatório foi coordenado pelo então ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira.
Enfim, nenhuma surpresa. Sempre se soube do envolvimento desses canalhas na articulação do golpe, mas agora a PF reuniu provas concretas para incriminá-los. Não dá mais para Bolsonaro e seus amigos se fazerem de vítimas, acusando o governo Lula, o STF e o TSE de perseguição política.
Bolsonaro e seus acólitos devem ser investigados, processados, condenados e presos, obviamente com direito à ampla defesa e o devido processo legal – algo que Lula não teve durante a Lava Jato. Mas o fato é que o Brasil já pagou muito caro por deixar impunes torturadores e assassinos da ditadura. Não temos mais o direito de repetir o erro com os golpistas da extrema direita.
As cabeças da hidra fascista precisam ser cortadas o quanto antes! Sem anistia aos golpistas!
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