Na atual conjuntura política nacional, uma dúvida inquieta diferentes setores da sociedade: até que ponto a direita radical e intolerante acha que pode esticar a corda? No ritmo que vai, tem tudo para provocar uma ruptura de proporções consideráveis e efeitos devastadores. Para a democracia, para a cidadania, para a civilidade.
O economista Luiz Carlos Bresser Pereira, ex-ministro nos governos Sarney e FHC, acaba de lançar um manifesto conclamando todas as forças políticas para uma repactuação nacional. O texto propõe um projeto de nação e conta com assinaturas de figuras expressivas nos mais diversos segmentos sociais, da intelectualidade, das artes, do mundo das leis, da política, da economia e do esporte.
Quem também tem defendido um grande entendimento nacional é o jurista e ex-ministro Nelson Jobim, personagem marcado por posições racionais e que conhece, na teoria e na prática, a fragilidade da democracia e os horrores do Estado de exceção.
É um grande erro das elites conservadoras imaginarem que, por possuírem o controle total das instituições e as usarem sem o menor pudor para driblar a frágil sequência democrática, poderão aplacar a ira dos desesperados, dos deletados, dos que necessitam dos serviços públicos e da responsabilidade social do capital. Princípios que o neoliberalismo tem pavor.
Claro que é possível haver desenvolvimento econômico em regime democrático ou autoritário, mas não há democracia ou ditadura que sobreviva com a economia em frangalhos. O Brasil agoniza economicamente. Não há solução mágica. O problema tem de ser resolvido pela via política. Somente um novo governo, eleito nas urnas, terá autoridade e capacidade para apontar o caminho menos doloroso para se retomar o crescimento com sustentabilidade, quer dizer, com justiça social.
O neoliberalismo é a prima-dona do autoritarismo e nega o próprio sufixo que carrega, pois de liberalismo não tem nada. Não respeita garantias individuais, impõe um mundo de mão única e representa um risco considerável à construção e ao aperfeiçoamento da democracia. De novo mesmo só a troca dos coturnos e das baionetas por togas e tribunais.
Fica impossível conceber um projeto político dito democrático que não tenha como meta principal a promoção do crescimento como ferramenta de superação da miséria, da pobreza, das desigualdades sociais. Pelo menos no plano da realidade brasileira, latino-americana, marcada por excessiva concentração da riqueza.
Como afirmam os sábios, os filósofos, a felicidade só alcança a plenitude no nós. É aquela confortável sensação de que fazer o bem faz bem, sentimento que consagra a natureza diferenciada do ser humano enquanto animal social e político.
Ao neoliberalismo só interessa o lucro, o mercado. Danem-se as pessoas, o meio ambiente. Mas as ruas estão gemendo, clamam por assistência, por justiça, e o desprezo, na política, é sempre perigoso. Como diz a sabedoria popular, "para quem está perdido, qualquer caminho é saída". E no atual momento brasileiro, a radicalização só estimula o ódio, a irracionalidade, a intolerância e o obscurantismo.
A raiz de toda desordem política e econômica remonta a 2014, mas se concretizou ano passado, com o impeachment sem crime de responsabilidade. A partir daí abriram-se os caminhos para outras aventuras institucionais perigosas. Não há a menor dúvida de que hoje o Brasil mantém um "caso" perigoso com o Estado de exceção. A tarefa é recolocar o trem na linha, pelo bem da nação.
O grande problema é que a ruptura institucional, assim como a mentira, sempre necessita de outra para corrigir o desvio original. Nunca se sabe onde vai parar. Na realidade, a mentira é uma ruptura, e vice-versa. Com toda a complexidade e riscos, dramas e sustos, a democracia ainda é o percurso menos traumático. Mas não cai do céu, precisa ser construída, defendida, praticada e aperfeiçoada a cada dia. Um desafio cotidiano.
Rogaciano Medeiros é jornalista
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