Dois homens, vestindo camiseta preta justa, se mostram perfilados um a frente do outro. O mais velho está atrás do mais novo. Ambos fazem um gesto que parece simular um falo - punho fechado e braço direito inclinado em ângulo de 45 graus. Não, não se trata de uma anúncio da G Magazine. A descrição retrata o adesivo de campanha eleitoral do candidato do PL à prefeitura de Belém, ladeado por um de seus correligionários, em disputa por vaga na câmara municipal.
A ascensão de movimentos de extrema direita trouxe à luz não apenas seus postulados, que se chocam com os princípios republicanos e com as instituições democráticas, mas também uma série de comportamentos e expressões que, à primeira vista, podem parecer contraditórios. Um desses aspectos é sua relação de apego a atitudes e condutas conhecidas como “tipicamente masculinas”, como a violência, a hipercompetitividade e o exercício de práticas que inferiorizam pessoas que se identificam com o gênero feminino, mas que, contudo, se apresentam embalados em uma estética francamente homoafetiva.
Esse fenômeno se revela na conformação de um ambiente saturado de homens, onde a companhia masculina é preferida e a misoginia é uma característica marcante. Movimentos de extrema direita ao longo da história usaram e abusaram desse estética e atitude, relativas aos afetos entre homens.
A presença predominante de homens nas fileiras da extrema direita não é portanto uma questão de demografia; ela revela uma construção social e cultural que valoriza uma forma específica de masculinidade, frequentemente associada a atributos como força, dominação e violência, que se entrelaçam com uma aversão ao feminino. A misoginia, então, não é apenas um subproduto dessas ideologias, mas uma parte central da narrativa que define a identidade dos grupos de extrema direita.
Essa masculinidade frágil é muitas vezes alinhada a práticas homoeróticas, que remontam a tradições históricas, como as das legiões romanas ou das colunas nazistas. A militarização da sociedade e a glorificação do homem como protetor e guerreiro criam um espaço onde a intimidade entre homens não é apenas torrada, mas exaltada, em um contexto que deslegitima a feminilidade e as relações heterossexuais de maneira mais ampla.
A estética da extrema direita é permeada por uma iconografia que valoriza a força física masculina e a virilidade. Imagens de homens musculosos, armados e em posições de poder dominam o imaginário coletivo bolsonarista, por exemplo. Essas representações não são apenas uma celebração do corpo masculino, mas também um reflexo de um desejo de pertencimento e camaradagem exclusivamente entre os homens.
Ademais, a relação com as armas e o militarismo não é apenas uma questão de defesa ou ataque; ela representa uma forma de expressão identitária. Os membros desses grupos frequentemente adotam uma estética bélica que remete a uma masculinidade factícia, onde o homem é visto como um guerreiro, leal a seus “irmãos de armas”. Lealdade que vai além da mera camaradagem, revelando relações de afeto que se estabelecem entre os homens, que mesmo quando não é declaradamente homoerótica, é, sim, homoafetiva, fator muitas vezes subestimado ou ignorado pela narrativa predominante, que associa a masculinidade à heterossexualidade.
Observar a estética homoafetiva da extrema direita é essencial para compreender as dinâmicas sociais que a sustentam. O combate à misoginia e à homofobia não deve ser feito apenas por meio da rejeição das ideologias de extrema direita, mas também pela promoção de uma masculinidade que valorize a diversidade, a empatia e a solidariedade. A desconstrução de estereótipos de gênero e a promoção de um espaço onde todas as formas de amor e afeto possam coexistir são passos fundamentais para superar a polarização que esses movimentos fomentam.
- Chico Cavalcante é membro da Associação Brasileira de Consultores Políticos.; é especialista em coordenação de projetos de marketing empresarial e comunicação pública, e atua como consultor de empresários e políticos.
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