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Ciência mostra que não adianta culpar raças de cães por ataques a pessoas (Foto: Nick Bolton/Unsplash)Ciência mostra que não adianta culpar raças de cães por ataques a pessoas (Foto: Nick Bolton/Unsplash)

Professores da Universidade de Liverpool, no Reino Unido, explicam por que banir raças de cachorros não é a solução para evitar que esses animais agridam humanos

Outro vídeo aterrorizante de ataque de cachorro acaba de se tornar viral nas redes sociais. Ele mostra três grandes cães do grupo bully pulando e agarrando uma mulher enquanto ela gritava em um parque.

É compreensível que, quando tais vídeos e reportagens da mídia circulam, haja novos apelos para banir certas raças. A mais recente é a American Bully XL, uma evolução criada a partir do pit bull terrier, que pode pesar até 60kg. Mas raças como essa são realmente as culpadas por um problema crescente de mordidas de cachorro?

Pesquisas mostram que uma em cada quatro pessoas já foi mordida por um cachorro durante a vida, mas menos de 1% das mordidas resultam em internação hospitalar. Nossa pesquisa mostrou que as internações hospitalares na Inglaterra por indivíduos “mordidos ou agredidos por um cachorro” aumentaram ao longo de um período de 20 anos, de 1998 a 2018. Esses dados dizem respeito a mordidas graves o suficiente para internação hospitalar, não apenas atendimento ao pronto-socorro. Durante um período semelhante, as mordidas fatais de cães na Inglaterra e no País de Gales foram em média três por ano.

Em 2022, foram dez vítimas mortais. Não está claro se esta é uma nova tendência ou se 2022 foi um ano tragicamente anômalo.

O aumento na incidência de mordidas de cães parece estar restrito aos adultos; os números dessas ocasiões triplicaram em 20 anos.

Em geral, os homens são mais propensos a serem mordidos e os entregadores são vítimas comuns. Ataques de cães a mulheres de meia-idade estão aumentando mais rapidamente. Não sabemos o porquê disso, mas pode ser que o perfil das pessoas que possuem e convivem com cachorros esteja mudando.

Encontramos taxas mais altas em comunidades menos favorecidas socialmente. As razões para isso são desconhecidas, mas tendências semelhantes também são observadas em outros tipos de lesões.

Algumas raças são mais agressivas do que outras?

Há pouca evidência científica consistente de que algumas raças são inerentemente mais agressivas do que outras. Nossas avaliações sugerem que as raças relatadas como as que mordem são simplesmente as mais populares em determinadas regiões.

No entanto, quando examinamos as raças envolvidas em fatalidades, fica claro que a maioria é grande e poderosa. Isso não quer dizer que raças menores não possam matar – elas têm casos disso. Como os da American Bully XL são uma nova sub-raça do American Bulldog, não houve nenhum estudo científico sobre seu risco de mordida; e as taxas de mordida estavam aumentando muito antes de eles existirem.

Eles e os outros bulldogs americanos e pit bulls relacionados aparecem no alto das listas de fatalidades. No entanto, rottweilers, pastores-alemães e malamutes também. Kenneth Baker, o ex-secretário para os Assuntos Internos do Reino Unido que foi responsável pela Dangerous Dogs Act ["lei dos cães perigosos"], que proibiu os pit bull terriers, admitiu em sua autobiografia que a proibição de rottweilers, dobermans e pastores-alemães teria “enfurecido” a classe média. Um fator de confusão aqui é a distribuição das raças, já que as poderosas há muito tempo estão ligadas a comunidades carentes onde a violência e os ferimentos já se centralizam. Algumas evidências ligam essas raças ao status ou ao uso criminoso; mas a maioria são animais de estimação de famílias.

A maioria das mordidas de cachorro são de um cão conhecido da vítima. Muitas vezes, este é o animal de estimação da família e as mordidas acontecem quando o tutor está acariciando, contendo ou apenas brincando com seu pet. O cão geralmente responde ao desconforto, seja dor ou medo.

O que podemos fazer para evitar mordidas de cachorro?


As tendências genéticas nas linhas de criação são um fator importante. Portanto, ao escolher um cão, é relevante ver e avaliar os pais do filhote. Cães da mesma raça variam amplamente em seu comportamento; essas tendências são herdadas dos pais.

Procure sinais de nervosismo ou timidez do animal quando ele está perto das pessoas, bem com ações de agressão direta (latidos, rosnados). Cães de fazendas de filhotes, em particular, são propensos a problemas de saúde e comportamento. Infelizmente, muitos filhotes que vêm desses criadores inescrupulosos de produção em massa são comercializados de forma fraudulenta como se fossem de uma família amorosa.

Banir mais raças não vai funcionar. Novas variedades preencherão a lacuna, como aconteceu com o pit bull.

Mordidas de cães são um problema social complexo e não podemos esperar que uma solução legislativa rápida (como a proibição de uma raça ou a reintrodução de licenças para cães) resolva. O licenciamento de cães seria proibitivamente caro de gerenciar e, sem uma fiscalização rigorosa, seria fácil de contornar isso.

Um design ambiental inteligente pode ajudar muito a evitar que pessoas e cães sejam expostos a situações de risco – por exemplo, instalando caixas de correio externas como padrão.

As pessoas costumam apresentar a educação como a resposta. Mas essa é uma pequena parte da solução. A educação pública precisa de medidas de fiscalização e políticas de apoio para funcionar. Melhorar as expectativas das pessoas sobre como funciona o bem-estar do cão é a chave para minimizar situações de medo e frustração para os cachorros. Isso inclui não abusar de cães em nome do adestramento e fornecer exercícios e espaço suficientes. Os métodos de treinamento devem ser gentis e baseados em recompensas, pois métodos baseados em punição estão associados a sucesso reduzido e maior estresse, medo e agressão.

Os esforços educacionais devem se concentrar em abordar a percepção de que “isso não aconteceria comigo” e introduzir novas normas sociais, como nunca deixar crianças sozinhas com cachorros. Existem muitos recursos sobre interações seguras com cães no site https://revistagalileu.globo.com/sociedade/curiosidade/noticia/2023/02/cachorro-de-30-anos-de-portugal-bate-recorde-de-cao-mais-velho-do-mundo.ghtml.

Não caia na armadilha de pensar “meu cachorro não morde ninguém”. Todos os dias, cães que nunca morderam alguém antes, o fazem.

Especialistas da Universidade de Liverpool explicam o que levar em conta na hora de abrigar um cachorro em casa (Foto: C Perret/Unsplash)Especialistas da Universidade de Liverpool explicam o que levar em conta na hora de abrigar um cachorro em casa (Foto: C Perret/Unsplash)

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