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 José Múcio observa Lula e o general Tomás Paiva em almoço com a cúpula do Exército em maio de 2023 (Foto: Ricardo Stuckert) José Múcio observa Lula e o general Tomás Paiva em almoço com a cúpula do Exército em maio de 2023 (Foto: Ricardo Stuckert)

Passado 1 ano da tentativa dos ataques de apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) na Praça dos Três Poderes, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, que faz a articulação com os militares admitiu que "havia vontade de golpe" em setores das Forças Armadas no fatídico 8 de Janeiro de 2022.

Indagado se havia risco de que militares aderissem a um golpe, Múcio eximiu as Forças Armadas como instituição, mas deixou claro que haviam membros dispostos a se juntar aos apoiadores de Bolsonaro.

"Podia ser até que algumas pessoas da instituição quisessem, mas as Forças Armadas não queriam um golpe. É a história de um jogador indisciplinado em uma equipe de futebol: ele sai, a equipe continua. No final, me parecia que havia vontades, mas ninguém materializava porque não havia uma liderança", afirmou Múcio em entrevista ao jornal O Globo.

O ministro ainda falou da discordância com o colega Flávio Dino, da Justiça, sobre a retirada dos manifestantes em frente ao QG do Exército. Múcio diz que defendeu uma retirada pacífica para não provocar "cizânia dentro das Forças Armadas".

"Será que se nós tivéssemos tomado uma providência mais dura, não teríamos promovido uma cizânia dentro das Forças Armadas? Fomos dentro do que a lei mandava. Por que a Justiça não determinou que se tirasse? Por que tinha que ser um ato imposto pela Defesa? A Justiça não tirou, só depois do dia 8. O ministro Alexandre de Moraes mandou tirar, poderia ter mandado dias 7, 6, 5... Não poderia partir de nós. Poderíamos ter precipitado uma cizânia. Faria tudo de novo do jeito que eu fiz. Por ter sido feito daquela forma é que hoje nós vivemos nesse ambiente de tranquilidade nas Forças", afirmou.

O ministro ainda confirmou que o então comandante do Exército, general Júlio César de Arruda, foi enfático ao não permitir a entrada da Polícia Federal no acampamento golpista, que ficava em área sob responsabilidade dos militares.

"Fomos lá negociar o que se faria, porque houve um momento de muita tensão, se a Polícia Federal entraria (no Quartel-General, para desmobilizar o acampamento). O comandante do Exército disse: “Aqui não entra”. Depois, fomos para lá e se negociou que a Polícia Federal poderia vir pegar as pessoas às 6h (do dia 9)", contou.

Mauro Cid e a demissão do comandante

Múcio ainda relatou que a demissão de Arruda do comando do Exército se deu justamente pela tentativa de nomeação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, para o comando do Batalhão de Ações e Comandos de Goiânia, unidade das Forças Armadas que faria intervenção em caso de decretação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em Brasília, por exemplo.

"No dia 20 de janeiro, surgiram as notícias de que o tenente-coronel Mauro Cid estava voltando. As coisas começaram a ficar tensas outra vez, porque estava destinada a ele uma promoção para um comando em Goiás, uma base importante do Exército. No sábado, 21, o presidente me ligou às 6h30m, contrariado. Desliguei o telefone e disse para minha mulher: 'Isso tem que ser resolvido hoje'. Liguei para o comandante do Exército e pedi que fosse ao Ministério da Defesa. Então, falei que precisava do lugar dele. Ele respondeu: 'O senhor está lembrando que me nomeou há 20 dias?' Eu disse: 'Estou, mas a gente precisa recomeçar a construir o clima de confiança, o que passa por colocar uma pessoa no seu lugar'”.

A partir de então, seguiu um processo para pacificação das Forças Armadas, segundo Múcio, com a nomeação do general Tomás Paiva para o comando do Exército.

Após o general ter aceitado o convite, no mesmo 21 de janeiro quando demitiu Arruda, Múcio contou que acertou o encontro dele com Lula.

Fomos para o Palácio do Planalto, o general Tomás vestido com roupa camuflada para combate, e de certa forma era. O general disse uma coisa que vou dizer pela primeira vez aqui: “Para que dê certo, o senhor precisa ter confiança nas Forças Armadas”. E ele (Lula) respondeu: “Vamos conversar, vamos em frente”.

Pacificação

Na entrevista, Múcio relatou ainda o clima de tensão com a cúpula das Forças Armadas durante a transição de governo. Segundo ele, desde 5 de dezembro de 2022, quando aceitou o convite de Lula para o ministério, buscou construir pontes com o generalato, mas não foi nem chegou a ser recebido pelo então comandante da Marinha, Almir Garnier, que é totalmente alinhado ao bolsonarismo.

"No dia 5 de dezembro, eu cheguei em Brasília, conversei com o presidente e fui anunciado (ministro da Defesa). E começa aí o meu 8 de janeiro. Primeiro, tive uma dificuldade enorme de chegar aos comandantes (das Forças Armadas). Só consegui na segunda quinzena de dezembro. O comandante da Aeronáutica cumpriu a Constituição e saiu no dia correto. O da Marinha não me recebeu, mas saiu no dia correto. O comandante do Exército me disse que queria sair no dia 20, mas fiz um apelo, e ele saiu 30 de dezembro", lembrou Múcio, que ressalta que hoje a relação com a cúpula militar está "muito boa, tenho até medo de dizer".

"O presidente tem uma relação direta, telefona para cada um dos comandantes. Minha tarefa foi essa, pacificar as relações", emendou.

Sobre as críticas, principalmente do campo progressista, sobre sua atuação junto aos militares, ele diz que "tudo tem seu tempo".

"São da democracia. Tem muitos que criticam, outros elogiam. Tudo tem seu tempo. Se nós estamos procurando aproximar, por que vamos mexer? Temos que reconstruir o clima de confiança, para que as pessoas não sintam que estão sendo punidas. Precisamos primeiro criar este clima e depois fazer o que algumas pessoas desejam".

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